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11/05/2022

Siderúrgicas e construtoras travam queda de braço sobre corte de imposto do aço

Setor de construção alega que alta do preço do aço pressiona custos, mas siderúrgicas contestam os números apresentados; governo se preocupa com o risco de aumento de demissões no segundo semestre, durante a campanha eleitoral

A possibilidade de o governo zerar a tarifa de importação do aço para ajudar no combate à inflação colocou em oposição dois gigantes da indústria nacional: os setores de siderurgia e da construção civil. O pano de fundo é a preocupação do governo com o risco de um aumento de demissões no segundo semestre no Brasil, justamente no auge da campanha eleitoral, que tem o presidente Jair Bolsonaro como candidato à reeleição.

 

Após reportagem do Estadão revelar na segunda-feira, 9, que o governo estava pronto para oficializar a medida, lideranças do setor desembarcaram hoje em Brasília para tentar reverter a medida, que será decidida em reunião nesta quarta-feira, 11. Outros 10 itens também deverão ter a tarifa cortada, incluindo alimentos e insumos da construção civil.

Depois de um encontro com o ministro da Economia, Paulo Guedes, os representantes das siderúrgicas foram até o Palácio do Planalto. Nas reuniões, ressaltaram que o setor tem dado apoio ao governo Bolsonaro e, agora, podem ser penalizados com essa medida, segundo apurou a reportagem.   

 

O presidente executivo do Instituto Aço Brasil, Marco Polo Lopes, disse que a redução do imposto de importação entrou no radar do governo a pedido da construção civil, que reclamou do aumento dos preços dos vergalhões utilizados no setor. Ele acusou o segmento de repassar ao ministro da Economia, Paulo Guedes, dados incorretos, como do aumento de preços de mais de 100% e de que está havendo demissão. “Isso não procede. Guedes falou de pressão intensa da construção civil, eles trouxeram ao ministro informações que não procedem”, disse Lopes. 

 

A resposta chegou rápido. O presidente da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (Cbic), José Carlos Martins, reagiu às declarações. “Não estamos demitindo porque honramos nossos compromissos. Estamos assumindo custos que eles nos geram e irão gerar desemprego futuro”, disse ele. As declarações foram feitas enquanto Polo ainda dava entrevista. Para ele, é desespero das siderúrgicas.

 

“Nós nunca noticiamos isso, pelo contrário. Todas as nossas estatísticas mostram que estamos contratando. O que disse ao Paulo Guedes: a venda de hoje é emprego de amanhã. Não vender hoje significa que na eleição em outubro vai ter desemprego”, revelou Martins. Segundo ele, a Cbic está pronta para um debate público para clarear todos os pontos. Ele ponderou que um terço do aumento de custo vem da alta do aço.

A Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc) divulgou nota na noite desta terça-feira para reforçar posição defendida pelo presidente da Cbic em relação ao preço do aço. Segundo a Abrainc, o material tem impactado o setor principalmente nos últimos dois anos, após sofrer, segundo a associação, uma variação de 101%. "O custo do aço no Brasil sempre foi um dos mais baratos do mundo, mas agora a situação mudou, principalmente quando  comparamos o poder de compra do brasileiro em relação aos imóveis", diz a nota assinada pelo presidente da Abrainc, Luiz França. 

 

Insumo elevado

 

O Estadão teve acesso ao estudo apresentado ao ministro Paulo Guedes pela Cbic. Os dados mostram que o insumo com maior peso no aumento do custo de material de construção, observado entre julho de 2020 e janeiro de 2022, foi o aço.  O presidente da Cbic citou que o programa Casa Verde e Amarela, por exemplo, não tem reajuste. "Vendeu em 2020, subiu 30%, 40% o custo do material, e tem que honrar", explicou. Ele ressaltou que 34% do aumento de custo do programa em um ano é do custo do aço.

Segundo Martins, o presidente de uma empresa siderúrgica declarou que eles estavam aproveitando a desvalorização do real para aumentar os preços. A queixa é que desde junho de 2020, depois que o mercado aqueceu novamente, as empresas estão controlando a oferta para que seja inferior a demanda. E, com isso, pressionar os preços.

 

Em nota divulgada nesta terça, a Abrainc também citou o impacto dos preços do aço no custo das obras do programa Casa Verde e Amarela.  Na avaliação do presidente da Abrainc, Luiz França, o impacto da alta do aço sobre o segmento é "enorme pela magnitude do programa de moradia popular".  "Não é correto pensar que essa variação prejudique uma ou outra empresa. Isso é um grande erro, uma vez que o CVA (programa Casa Verde e Amarela), por exemplo, representa 80% de todas as moradias construídas no Brasil e, com isso, gera anualmente 1,4 milhão de empregos."

 

Já o setor de aço diz que há oferta abundante do produto no Brasil e que, enquanto na Europa os preços subiram mais de 100% e, nos Estados Unidos, 70%, no Brasil a alta foi de 40%.

O anúncio da redução do tributo derrubou ações das siderúrgicas, com Usiminas, CSN e Gerdau caindo 6,78%,5,82% e 4,36%, respectivamente. 

 

Instabilidade na Bolsa

Ações de siderúrgicas do País perderam valor com possibilidade de corte de impostos de importação

Após a reunião, participantes do setor privado disseram que Guedes “se sensibilizou” e pediu que a equipe reavalie a questão. De acordo com o presidente executivo do Instituto Aço Brasil, Marco Polo Lopes, o que está em discussão no governo é a redução do tributo apenas para vergalhões, de 10,8% para 4% e não todos os produtos derivados de aço, como foi noticiado.

 

Na reunião, Guedes disse que a “grande preocupação” do governo é o combate à inflação, o que, para os representantes da indústria, não será resolvido com a redução do imposto de importação, já que o vergalhão de aço tem pouco impacto no preço dos produtos. “O mercado está abastecido, o Brasil tem o vergalhão mais barato do mundo”, disse Marco Polo.

O presidente do Conselho Diretor do Aço Brasil e vice-presidente da Gerdau Aços Brasil, Argentina e Uruguai, Marcos Faraco, disse que a decisão é “inócua” e atende apenas segmentos que querem aumentar a margem de seus negócios. “Nossa expectativa é que o governo reverta a decisão", afirmou.

 

Matéria publicada em 10/05/2022

FONTE: ESTADO DE S.PAULO