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29/08/2017

Regras sobre distrato de imóveis é repudiada por entidades de defesa do consumidor

Os órgãos de proteção ao consumidor ressaltam que tais disposições não apenas transferem todo o risco do negócio ao consumidor

A Associação Nacional do Ministério Púbico do Consumidor (MPCON), constituída por membros dos Ministérios Públicos dos Estados e do Distrito Federal e de membros do Ministério Público Federal, e os órgãos e entidades de defesa do consumidor expressaram seu total repúdio à edição de medida provisória voltada a regular aspectos do contrato de compra e venda de imóveis, notadamente no que se refere à questão dos distratos, onde nitidamente se verifica uma série de graves violações a direitos dos consumidores garantidos por lei e plenamente reconhecidos pela jurisprudência pátria. 
 
A referida medida, ao prever a possibilidade de retenção pela construtora de quantias superiores a 50% do valor que efetivamente já tenha sido pago pelo consumidor, contraria integral e frontalmente o entendimento já consolidado na jurisprudência dos tribunais superiores de que eventual sanção pelo inadimplemento contratual não pode implicar a perda pelo consumidor de quantias superiores a 25% daquilo que já tenha pago pela aquisição do imóvel, o que, por si só, já se considera bastante elástico. 
 
?É de causar perplexidade a utilização do instrumento excepcionalíssimo da medida provisória para regular matéria de tamanha importância, mormente quando já existe, desde 2015, projeto de lei em plena discussão no Congresso Nacional com o mesmo objeto (PL 774/2015), onde as discussões legislativas já reconheceram a necessidade de se limitar tal percentual de retenção a 10% do valor que tenha sido pago pelo consumidor, na esteira do que já é previsto em lei para a compra e venda de imóveis em loteamentos (vide art. 26, inciso V da Lei 6.766/79 e art. 11, alínea ?f? do Decreto-lei nº 58/37)?, diz o documento redigido pelas entidades, reunidas em Recife, Pernambuco, para o XVII Congresso Nacional do Ministério Público do Consumidor. 
 
Além do MPCON, assinaran o manifesto a Comissão Nacional de Defesa do Consumidor da OAB e comissões estaduais, ProconsBrasil e Procons de vários estados, Fórum Nacional das Entidades Civis, Associação Defesa e Orientação ao Consumidor do Grande Rio (Adecon-RJ) e defensores públicos da Comissão do Colégio Nacional dos Defensores Públicos Gerais (Condege). 
 
Os órgãos de proteção ao consumidor ressaltam que tais disposições não apenas transferem todo o risco do negócio ao consumidor, desonerando as construtoras de qualquer responsabilidade financeira pela continuidade dos empreendimentos ofertados ao consumidor, como estabelecem ônus de altíssima monta ao consumidor que se vê impossibilitado de continuar seus pagamentos e na iminência de perder a moradia recém-adquirida, com a devolução do imóvel livre e desembaraçado ? muitas vezes valorizado ? para a construtora, a qual poderá revendê-lo novamente a preço integral, em nítido enriquecimento sem causa. 
 
?Crises econômicas não podem ser motivo de fragilização de direitos consolidados por décadas no ordenamento jurídico e, muito menos, quando eventual fragilização pretende evitar o debate legislativo constitucional já estabelecido, como ocorre na hipótese. Não obstante o crescimento da atividade econômica deva ser constantemente estimulado, esse estímulo não pode instrumentalizar-se na viabilização de confiscos abusivos de valores pagos por consumidores que sofrem até mais fortemente dos efeitos dessa mesma situação econômica?, acrescenta o documento. 
 
?Como se não bastasse perder o sonho da casa própria, se essa medida for publicada, ele ainda perde metade do que pagou por um imóvel que a construtora vai vender novamente. Ou seja, o consumidor, que é a parte mais frágil dessa relação, perde duas vezes?, disse Jorge Braz, presidente do Procon Carioca, uma das entidades signatárias da nota de repúdio as novas regras do distrato.

FONTE: O GLOBO