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03/10/2025

Prédios em bairros nobres de SP envelhecem, condomínio sobe e imóveis se desvalorizam; veja onde (Estadão)

Apartamentos podem ficar encalhados ou ser vendidos por preços abaixo do valor de mercado por causa de custos mensais elevados

 

Por Lucas Agrela

 A empresária Fernanda Klüppel tem um imóvel de família nos Jardins que está sem moradores desde 2013 devido à dificuldade de alugar ou vender o apartamento, que tem uma taxa condominial de R$ 6,5 mil ao mês. O imóvel de 240 m² fica em um prédio com 14 unidades, ou seja, esses poucos proprietários precisam arcar com as despesas do edifício construído na década de 70 e com as medidas de segurança típicas de um empreendimento de luxo.

 “O apartamento vale entre R$ 2,5 milhões e R$ 2,8 milhões, de acordo com avaliações do mercado. É difícil definir por quanto toparíamos vender, porque ele gera um prejuízo médio de R$ 100 mil no ano. Por mais que sejam muitos proprietários, o valor fica bem pesado”, conta Fernanda.

 Ela diz ainda que um efeito não relacionado ao apartamento tem reduzido a liquidez de venda da propriedade: a pujança do mercado imobiliário de São Paulo. A cidade atingiu recentemente o número recorde de 130 mil unidades lançadas nos últimos 12 meses, segundo dados da consultoria de inteligência de dados Brain.

 “Os bairros mais centrais e de luxo de São Paulo estão passando por uma verticalização cada vez mais intensa, o que gera mais disponibilidade de imóveis novos, que não tem esses outros custos, além de terem áreas de lazer. Isso reduz a procura por apartamentos e casas mais velhos. Esses imóveis encalham e favorecem, inclusive, a inadimplência”, diz.

A história de Fernanda reflete uma realidade que afeta proprietários de imóveis em toda a cidade. Com o passar dos anos, os prédios começam a ter mais custos e a taxa condominial sobe. Esse efeito pode levar os moradores a comprar novos apartamentos, mas a venda ou locação dos antigos imóveis é difícil por causa do custo fixo que é o condomínio. Se no passado, os apartamentos eram moradias apenas dos consumidores de alta renda, eles são hoje opções para todas as faixas de renda, o que pode generalizar o problema, segundo especialistas.

Dados levantados pela plataforma imobiliária Loft mostram que os apartamentos com os maiores preços de condomínio atualmente são os mais antigos. As construções da década de 80 se destacam, quando incorporadores colocaram mais itens nas áreas comuns, como piscina, spa ou quadras. Nessa época, diferentemente do que ocorre hoje, era comum que os apartamentos fossem amplos, com mais de 100 metros quadrados, e com poucas unidades por edifício.

 “Os prédios novos com muitas amenidades também têm esse gasto de manutenção desses equipamentos, mas ainda não tem a questão da idade. Então, provavelmente os imóveis construídos nessa década, daqui a 20 ou 40 anos, vão começar também sentir esse mesmo efeito que vemos agora nos apartamentos dos anos 80”, diz o gerente de dados da Loft, Fábio Takahashi.

Os prédios residenciais mais antigos da cidade de São Paulo ficam nos Jardins, no Paraíso, na Vila Nova Conceição, no Itaim Bibi, na Bela Vista, na Vila Mariana, em Pinheiros e em Moema.

Para Marcello Romero, CEO da imobiliária Bossa Nova Sotheby’s International Realty, não há dúvida de que os condomínios-clubes lançados a partir de 2015 no País vão gerar custos elevados de taxas condominiais no futuro, uma vez que os gastos com manutenção e segurança serão similares.

“Tem uma relação direta entre a quantidade de amenidades e o nível de serviço. Em condomínios muito grandes há um número maior de unidades para a divisão de custos. O grande problema é quando você tem um número reduzido de unidades no condomínio e um número muito grande de amenidades. Mas cabe ressaltar que o maior custo é sempre com segurança”, diz Romero.

Esse tipo de custo fixo associado a um apartamento pode reduzir a liquidez para venda e deixar proprietários com uma dívida nas mãos. O presidente do Creci-SP, José Augusto Viana Neto, diz que não é raro ver casos em que o proprietário aluga um imóvel apenas pelo preço do condomínio ou mesmo vende o bem com desconto. Ele conta que é comum, também, que os herdeiros de imóveis os vendam por falta de capacidade de arcar com o custo mensal do condomínio.

“Os prédios que são possuidores de muitos equipamentos, a princípio, parece ser uma coisa saudável, confortável, mas quando todos esses equipamentos começam a dar manutenção, aí é que a pessoa vê a dificuldade que é prédio com piscina, sauna e outros itens. Muito gramado ou jardim também requer manutenção constante. É tudo muito bonito, mas muito caro”, afirma Viana Neto.

Redução de custos

O profissional de TI Laerte Bernardi atua como subsíndico no condomínio onde mora em São Bernardo do Campo. Ele conta que analisou todos os custos do prédio, fazendo uma projeção anual dos gastos com funcionários, como porteiros e faxineiros, e comparando com o quanto custaria para contratar uma portaria eletrônica e um funcionário de serviços gerais. Com isso, concluiu que essa seria uma forma de reduzir o preço pago na taxa condominial, que estava subindo ano a ano.

 “Conseguimos passar o condomínio de R$ 1,7 mil para R$ 1.120”, conta Bernardi. O condomínio é dos anos 80, e já precisou fazer manutenções periódicas, como pintura e pequenas reformas. Bernardi conta que a gestão do caixa estava funcionando quase que em um modo automático, e, ao fazer as contas, viu que havia dinheiro o suficiente para fazer as mudanças necessárias para reduzir o custo do condomínio, fazendo uma transição gradual para um sistema menos custoso. “A ideia é que essas mudanças aumentem a liquidez e até o valor dos apartamentos do prédio”, afirma.

 A diretora de marketing da administradora de condomínios Lello, Angélica Arbex, afirma que os condomínios que fazem uma boa gestão de caixa e planejamento tendem a manter os custos mais controlados e previsíveis, evitando sobressaltos que levam a gastos elevados. Ela pondera que os prédios com muitas áreas comuns tendem - em tese - a ter melhor gestão e número de unidades para fazer o rateio das despesas.

 “Condomínios com muitos equipamentos tipo clube têm mais áreas para preservar e atualizar, como, por exemplo, quadras, mobiliário de piscina, áreas gourmet, salões de festa, salões temáticos e salões de jogos. Portanto, demandam um cuidado semelhante ao de clubes. Porém, estes condomínios têm também uma estrutura de gestão voltada a eles e um número de unidades maior para fazer frente ao orçamento necessário”, diz Angélica.

A especialista afirma ainda que o melhor para manter as manutenções em dia é começar pela atualização elétrica e hidráulica dos prédios e depois partir para melhorias em elevadores e na estética do edifício.

Inadimplência

A inadimplência de condomínios tem subido e chegou a 7,19% em junho, atingindo um nível recorde nos últimos 13 meses, de acordo com dados da plataforma financeira para condomínios Superlógica. O valor das dívidas, somadas, chega a R$ 7 bilhões. A base de dados que embasa o índice é composta por aproximadamente 120 mil condomínios de todas as regiões do País.

Segundo o diretor de crédito da Superlógica, João Baroni, a inadimplência atinge todas as faixas de renda e está ligada ao cenário de inflação e juros altos que vêm comprometendo a renda dos brasileiros nos últimos meses.

“As pessoas não pagam (o condomínio) normalmente porque o bolso está apertado. A maior parte das vezes é isso. Existem casos de exceção, mas na parte das vezes é por isso”, diz.

Baroni conta que são muito raros os casos em que os proprietários deixam as dívidas do condomínio levar imóveis a leilão, o que é a última instância da cobrança e coloca o apartamento à venda por um valor abaixo do preço de mercado para quitar os débitos. “Normalmente, fazem um acordo”, diz.

 

FONTE: ESTADãO