Notícias

07/07/2017

Odebrecht faz baixas de R$ 5,9 bi na construtora

A receita líquida teve queda de 41% ante 2015, de R$ 33 bilhões para R$ 19,4 bilhões. O valor de comparação de 2015 exclui o efeito da inflação na Venezuela.

A Odebrecht Engenharia e Construção (OEC) apresentou ontem aos seus investidores o balanço de 2016, com ajustes negativos totais de R$ 5,9 bilhões. O objetivo da companhia, com isso, foi "corrigir" todo o passado e virar a página também nos resultados. Os números são encarados como uma espécie de "marco zero" para a história do negócio.

"Queremos dar estabilidade às contas daqui para frente, sem ter que ajustar aos poucos, por trimestre. É o primeiro passo na linha de ajustar as contas para pavimentar o caminho até um IPO [oferta pública inicial de ações]", disse Marco Rabello, diretor financeiro da OEC, com exclusividade ao Valor.

Do total do ajuste, R$ 4,6 bilhões são consequência direta dos atos de corrupção praticados e revelados pela Operação Lava-Jato. Dessa fatia, há R$ 3,2 bilhões em provisões para acordos de leniência fora do Brasil - os já fechados e os que ainda estão em negociação. No país, o montante inclui só a expectativa de acordo com o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade). O acerto com o Ministério Público Federal (MPF) não está nas contas, pois será pago pela controladora Odebrecht (ODB).

Segundo Rabello, a OEC está em conversas com todos os 11 países em que admitiu o pagamento de US$ 439 milhões em propinas, na soma geral. As provisões terão efeito caixa, mas em pagamentos parcelados, com prazos longos.

Ainda relacionado à Lava-Jato, a companhia fez uma redução de R$ 1,4 bilhão diretamente no patrimônio líquido que diz respeito ao Programa de Regularização de Tributos (PRT). Trata-se do imposto devido sobre contas não reconhecidas anteriormente. Apenas 24% desse montante significará saída de caixa - o restante foi abatido de créditos fiscais. O ajuste refere-se aos últimos seis anos.

Além dos efeitos ligados ao passado de corrupção, a OEC decidiu também rever o valor de ativos, que foi reduzido em R$ 1,3 bilhão. São obras que não têm mais chances de trazer o retorno esperado. "Aproveitamos para limpar tudo."

As correções fizeram a OEC registrar prejuízo de R$ 2 bilhões em 2016, ante lucro de R$ 890 milhões, em 2015. É o primeiro prejuízo desde 1999, que marca o início dos registros da empresa.

Considerado só o desempenho operacional, sem efeitos extraordinários, o lucro teria quase triplicado, passando a R$ 2,5 bilhões - após alívio sobre a dívida internacional, com a queda do dólar.

A receita líquida teve queda de 41% ante 2015, de R$ 33 bilhões para R$ 19,4 bilhões. O valor de comparação de 2015 exclui o efeito da inflação na Venezuela.

O Ebitda (lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização) ficou em R$ 1,5 bilhão no ano passado - margem de 8%. De acordo com Rabello, os cortes de custos e ganhos de eficiência permitiram que a margem não se afastasse da média histórica (9% a 10%).

Rabello comemorou que, mesmo após os ajustes bilionários, a OEC manteve indicadores de solidez suficientes para disputar grandes projetos. O patrimônio líquido, sobre o qual recai todo efeito extra, ficou em R$ 5,8 bilhões.

A carteira de contratos, que contém somente aquelas com financiamento, fechou o ano em US$ 16,7 bilhões (72% fora do país). Eram US$ 28 bilhões em 2015.

Segundo Rabello, a redução reflete a crise no Brasil e em países nos quais atuam, com destaque para América Latina e África. Além disso, cerca de US$ 3 bilhões estão relacionados à venda de ativos do grupo (que resultaram em perda de obras à construtora) e à limpeza de contratos problemáticos.

A erosão da carteira da OEC é uma das principais preocupações de investidores em títulos da empresa e também dos bancos que financiam o grupo. Os contratos da construtora com as demais empresas Odebrecht representam 15% do total.

A liquidez da empresa é acompanhada com lupa pelo mercado. A OEC fechou 2016 com R$ 4 bilhões em caixa (US$ 1,3 bilhão). Ao fim de 2015, esse montante estava em R$ 10 bilhões (US$ 2,5 bilhões ao câmbio da época).

Rabello afirmou que a OEC tem duas frentes claras de trabalho para melhoria dos resultados. A companhia espera elevar a carteira em US$ 1,5 bilhão ainda este ano. Além disso, adotou esforço extra para redução no consumo de caixa, desde setembro do ano passado. No fim de junho deste ano, o saldo estava em US$ 1 bilhão e a companhia planeja terminar 2017 com US$ 1,1 bilhão de saldo.

O plano da OEC para o triênio 2017-2019 não contém previsão de pagamento dos dividendos.

"É essencial conquistar novas obras e ampliar a geração de caixa", disse o executivo, destacando que a carteira atual equivale a pouco mais de três anos - para 2017, a receita é estimada em "pouco menos" de US$ 5 bilhões.

A companhia fechou o balanço consolidado de 2016 com dívida bruta em R$ 11 bilhões, ante R$ 14 bilhões no ano anterior. A redução deve-se principalmente ao efeito da valorização do real ante o dólar, pois a empresa não possui amortizações relevantes nos próximos anos. O prazo médio dos compromissos é de 33 anos.

Porém, a dívida líquida teve piora significativa, pelo consumo do caixa: de R$ 4 bilhões para R$ 7 bilhões, na comparação anual.

Para as demonstrações de 2016, a OEC contratou a BDO, que entrou no lugar da PricewaterhouseCoopers (PwC). A firma de origem britânica sabidamente auditava o grupo há cerca de 50 anos.

Rabello disse que a renovação ocorreu em janeiro. Foi solicitado à BDO que analisasse as contas também de 2015. O contrato com a casa belga vale, pelo menos, até o balanço de 2017. "Um time com nada menos do que 108 auditores esteve aqui. O trabalho foi muito intenso, para o espaço de tempo", contou o executivo.

A meta de "limpar o passado" do balanço e a troca dos auditores foram a razão do atraso na divulgação aos investidores, que deveria ter ocorrido até o fim de abril. 

FONTE: VALOR ECONôMICO