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14/07/2025

Nova faixa do MCMV reduz venda direta de construtoras – Valor Econômico

Análise da empresa de crédito imobiliário Liquid aponta tendência; inadimplência na entrada da unidade é preocupação

Por Ana Luiza Tieghi

Uma alternativa para quem trabalha com imóveis compactos e alta renda, as vendas diretas podem estar em declínio para incorporadoras do Minha Casa, Minha Vida (MCMV). Levantamento feito pela Liquid, que atua na análise de crédito imobiliário, aponta que a criação da faixa 4 do programa, para famílias com renda de R$ 8,6 mil a R$ 12 mil mensais, faz com que o MCMV inclua até 65% das unidades até então vendidas diretamente, ao menos na sua carteira, que conta com 60 incorporadores.

“Isso representa uma oportunidade expressiva de redução da exposição financeira das incorporadoras, ao permitir o redirecionamento do crédito para o sistema formal, com menor risco e maior previsibilidade de recebíveis”, afirma Thiago Yaak, um dos fundadores da Liquid.

Ele ressalta que a nova faixa tem a capacidade de “destravar capital de giro, reduzir inadimplência e aumentar a atratividade dos empreendimentos junto ao público-alvo”. Ela funciona, também, como um “vetor de liquidez” para o setor, pontua.

Ronaldo Cury, diretor de relações com investidores da incorporadora Cury, concorda com a tendência. “Devemos diminuir o percentual de tabela direta”, afirma, embora a empresa ainda esteja apurando seus números.

Já na Direcional, outra grande incorporadora do MCMV, não é esperada queda nesse tipo de venda. Ricardo Gontijo, CEO da empresa, afirmou no início do mês que seus clientes que fazem compra direta continuam de fora da política habitacional. “Como o prazo da venda direta é de no máximo 120 meses, a renda necessária acaba sendo superior aos R$ 12 mil”

Outro tipo de financiamento que as incorporadoras do MCMV fazem ao cliente é o parcelamento da entrada, que não é coberta pela linha de crédito da Caixa Econômica Federal. Esse parcelamento, que não tem garantia - uma vez que a unidade é garantia do empréstimo com o banco - é chamado de pró-soluto.

Para mitigar os riscos, as empresas tentam fazer com que o cliente conclua o pagamento antes da entrega das chaves. Sem garantia e com o cliente já morando no imóvel, o risco desse crédito sobe ainda mais.

Dados da Liquid mostram que a taxa média de inadimplência nas carteiras de pró-soluto é de 5 a 10 vezes maior do que no financiamento bancário.

A Liquid relata, ainda, que a parcela de pagamento recebida pelos incorporadores no ato da compra têm caído, de 15% a 30%. Segundo Yaak, isso indica uma diminuição da capacidade dos compradores de amortizar o saldo devedor, e também um esforço maior das incorporadoras em acelerar as vendas, já que estariam aceitando clientes que podem pré-pagar menos da entrada. Com isso, cresce o montante no pró-soluto.

Para evitar problemas, só 10% da carteira de pró-soluto da Cury está na fase “pós-chaves”, afirma Ronaldo. Ele conta, porém, que há empresas que dividem o saldo em 60 meses após a entrega da unidade, correndo maior risco.

Enquanto essa carteira cresce, há um outro ponto de atenção para as incorporadoras. É comum que elas “empacotem” suas carteiras de pró-soluto em Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRIs), distribuídos no mercado, para adiantar o recebimento dos valores. No entanto, a proposta de taxar os CRIs, hoje isentos, em 5% no imposto de renda, pode afetar a atratividade do instrumento.

“A expectativa é que as taxas de desconto aplicadas sobre esses recebíveis sejam mais altas”, disse Gontijo, acrescentando que ainda não é possível prever o cenário com certeza.

Isso significaria menos recurso entrando no caixa das empresas e “menos capital de giro, menos obra, menos produto ofertado e provavelmente um incremento de preço de produto”, completou o executivo, em efeito cascata.

“O risco regulatório adiciona camada extra de incerteza, tornando o acesso ao capital via CRI ainda mais desafiador para ‘players’ médios e pequenos”, diz Yaak.

 

FONTE: VALOR ECONôMICO