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01/07/2016

Fitch vê alta da inadimplência seguir até 2017

Em um cenário de estresse em 2017, com recuo de 3% na atividade, a inadimplência teria potencial para atingir 5,2%.

Os grandes bancos brasileiros terão que lidar com a inadimplência em alta também em 2017, ainda que a economia volte a crescer no ano que vem. Para a Fitch Ratings, novos casos de calotes corporativos devem vir pela frente, afetando a rentabilidade das instituições financeiras. No caso de Caixa Econômica Federal e Banco do Brasil, a agência de classificação de risco vê um desafio adicional: mantidos os atuais níveis de lucratividade e de avanço do crédito, esses dois bancos podem precisar de algum tipo de capitalização, já no fim de 2017 ou em 2018.

As conclusões constam em relatório elaborado pela agência e obtido com exclusividade pelo Valor. Nas contas da Fitch, mesmo considerando um pequeno crescimento econômico de 0,5% no ano que vem, a taxa de inadimplência dos bancos brasileiros deve chegar ao fim de 2017 em 4,8%, após encerrar 2015 em 3,4% e alcançar 4,2% em 2016. Em um cenário de estresse em 2017, com recuo de 3% na atividade, a inadimplência teria potencial para atingir 5,2%.

Esin Celasun, uma das analistas responsáveis pelo relatório, diz que apesar da recuperação modesta do PIB, os indicadores de crédito demoram mais para melhorar. "A recuperação do crédito não é imediata, vem sempre um pouco depois, às vezes dois ou três trimestres." Esin afirma que o cenário da Fitch contempla novos casos de calotes de grandes empresas, além dos já conhecidos Sete Brasil, fabricante de sondas para o pré-sal, e a operadora de telefonia Oi, que pediram recuperação judicial neste ano. No relatório, os analistas citam como potenciais fontes de problemas para os bancos as siderúrgicas Usiminas e CSN, junto com a mineradora Samarco.

A expectativa da agência é que o impacto dessa elevação de calotes seja maior sobre os bancos públicos do que sobre os privados.

Para Banco do Brasil e Caixa, além da inadimplência, a agência avalia que atingir os níveis mínimos de capital exigidos pelo Banco Central, que vão aumentar gradualmente até 2019, pode ser também um desafio a partir do fim de 2017. "Nos patamares atuais de crescimento de crédito desses bancos e considerando a lucratividade dos últimos dois trimestres, esses bancos podem sim precisar de capital em 2018", afirma Esin.

Isso não significa que a União terá de aportar recursos nas instituições. "A capacidade de aporte de recursos da União hoje é menor do que já foi no passado. Se esses bancos precisarem de suporte, há outras medidas que podem ser adotadas pelo governo antes de um aporte de capital", diz a analista.

A principal delas seria o que a Fitch chama de "leniência regulatória". O Banco Central segue um cronograma internacional para implementação das regras de Basileia 3, que determinam que os bancos precisarão de mais capital para fazer frente aos seus riscos. Na avaliação da Fitch, o BC poderia adiar a exigência de algumas dessas regras, o que daria mais tempo aos bancos para levantar recursos.

Outra possibilidade é diminuir o capital exigido para determinados tipos de crédito, como o imobiliário e rural. Segundo Pedro Gomes, diretor da agência, nesses casos a exigência do regulador brasileiro supera a média mundial, o que permitiria a redução. "Há um histórico de postergação de regras no Brasil para evitar que bancos venham a ter problemas", diz.

Uma desaceleração ainda mais acentuada do crédito poderia também mitigar a necessidade de levantar capital. A agência nota que os bancos públicos já têm pisado no freio: de 2011 a 2014, sua carteira de crédito cresceu em média 23% ao ano, desacelerando para 11% em 2015 e 6% até abril de 2016.

A preocupação com a necessidade de capital por parte dos bancos públicos nos próximos anos é frequentemente levantada por economistas e analistas de instituições financeiras. Nas contas de um analista ouvido pelo Valor, a necessidade de capital da Caixa rondaria os R$ 30 bilhões em três anos, levando-se em consideração os ativos ponderados ao risco, que hoje crescem 10% ao ano. Nos outros bancos, esses ativos estão em queda. Já no BB, essa necessidade poderia chegar a R$ 20 bilhões.

Em março, BB e Caixa tinham índices de capital principal, aquele de melhor qualidade, acima do mínimo exigido pelo BC, mas abaixo dos pares privados (8,2% e 9,5%, respectivamente).

As instituições já têm adotado medidas para não precisar de recursos do Tesouro. A Caixa listou ao Valor ações como a desaceleração do crédito, redução da distribuição de dividendos ao Tesouro, cortada para 50%, além de buscar novas fontes extraordinárias de receitas, ao vender parte dos negócios de loterias instantâneas, seguridade e, posteriormente, cartões.

Procurado, o BB reafirmou o compromisso de estar com 9,5% de capital próprio até 2019 - frente à exigência regulatória que pode variar entre 7% a 9,5% quando as regras de Basileia 3 estiverem em pleno vigor. O banco, porém, não detalha as medidas que serão tomadas para esse fim.

Para um analista de um banco nacional, o fato de os ativos ponderados pelo risco do BB terem parado de crescer são um bom sinal nessa direção. Ele afirma que um alívio nas exigências de capital do crédito rural trariam grande benefício à capitalização do BB.

Além de aumento de inadimplência, a Fitch também prevê lucros menores para o sistema financeiro brasileiro. No cenário base da agência, a queda seria de 26% neste ano, para R$ 74,6 bilhões, com alguma recuperação em 2017, para R$ 92,6 bilhões. Em um cenário de stress, porém, a queda em 2016 poderia chegar a 85,8%. 

FONTE: VALOR ECONôMICO