O texto final para regulamentação dos distratos - cancelamento da venda de imóveis - segue pendente de regulamentação, diante da falta de acordo entre representantes das incorporadoras e dos órgãos de defesa do consumidor. Entre as divergências, estão definições relacionadas ao prazo de entrega de imóveis e cobrança de multa em caso de atrasos de obras, à inclusão ou não de imóveis comerciais na regulamentação e o momento em que a incorporadora deve devolver o dinheiro ao cliente.
"Faltou mais vigor e pressão por parte do setor na reunião", disse uma fonte. Representantes das incorporadoras, do governo e de órgãos de defesa do consumidor se reuniram, ontem, em Brasília, na Casa Civil. Lá, foi apresentado texto preliminar com regras para os cancelamentos de vendas para aprovação. Não há data marcada para a próxima reunião sobre distratos. A ausência de regulamentação continua a pesar na tomada de decisões das companhias em relação a lançamentos.
Segundo a fonte, a definição da faixa de prazo de entrega dos imóveis é a maior pendência na discussão. "O prazo, que é fixo, passará a ser uma faixa de seis meses, mas ainda não há acordo de como será definida", afirmou. Falta acordo quanto à cobrança de multa de 0,5% ao mês de quem atrasar a entrega, disse o presidente da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), José Carlos Martins. Ele ressalta que a concessão, por um lado, depende de algo a ser cedido também pela outra parte.
Ainda não se chegou a um acordo, segundo o presidente da Associação de Dirigentes de Empresas do Mercado Imobiliário (Ademi-RJ), Claudio Hermolin, se as multas por atraso de entregas devem ser aplicadas aos contratos assinados, daqui para frente, ou estendidas a todos os acordos já vigentes.
Um técnico do governo também disse que um dos empecilhos para se chegar a um acordo em torno das novas regras de regulamentação dos distratos é a definição sobre se elas valerão para ainda para o estoque. Na avaliação do técnico, assim como em outras legislações já aprovadas, os novos critérios valeriam apenas "daqui para frente". Independentemente desse debate, ele afirmou que o acordo está próximo de ser firmado.
Outro ponto sem consenso ainda, de acordo com Hermolin, é o momento em que os recursos devem ser devolvidos ao comprador em caso de distratos. "A incorporadora não pode utilizar recursos necessários à finalização da obra até que o patrimônio de afetação seja extinto. Se o instrumento é respeitado, o pagamento só pode ser feito depois de o patrimônio de afetação ser encerrado", diz o presidente da Ademi-RJ.
Segundo o presidente da CBIC, ainda há discordância entre o limite da retenção pelas incorporadoras em caso de distratos de imóveis residenciais até R$ 300 mil. O setor defende parcela de 50%, com teto de 8% do valor do contrato, enquanto órgãos de defesa do consumidor pleiteiam 20% do dinheiro pago, com limite de 5% do valor do contrato - retenção considerada muito pequena, segundo Martins. De acordo com outra fonte setorial, porém, já há consenso que a multa seja de 30% do valor desembolsado.
A maior parte das entidades que representam o setor imobiliário quer imóveis comerciais fora da regulamentação para os distratos, segundo o presidente da Ademi-RJ. "Queremos que a regulamentação trate, exclusivamente, de imóveis residenciais. Quem comprou uma sala ou uma loja não fez a aquisição para morar, mas como um investimento financeiro. Toda decisão de investimento tem um risco", diz o dirigente da Ademi-RJ.
Já o presidente da Associação Brasileira das Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc), Luiz Antonio França, diz que as negociações entre representantes do setor de construção e órgãos de defesa do consumidor "estão indo bem e devem ser concluídas em breve". "A reunião foi boa, mas ainda há pontos a serem discutidos", disse França, após o encontro.
O vice-presidente de desenvolvimento urbano e meio ambiente do Secovi-SP - o Sindicato da Habitação -, Caio Portugal, ressalta que as discussões vão exigir reavaliação pelas duas partes.
Dados da Abrainc apontam que, em abril, os distratos foram 39,6% das vendas de imóveis. Em 12 meses, a participação das rescisões nas vendas foi de 50,9%. O levantamento inclui dados de 20 empresas associadas à Abrainc.