O mercado de crédito vai registrar neste ano o pior desempenho desde a virada do século. Nos 12 meses acumulados até novembro teve expansão de 7,4% e atingiu o patamar de R$ 3,18 trilhões. Mas o Banco Central (BC) acaba de revisar para baixo suas projeções, cortando para 7% a expectativa de crescimento do crédito em 2015 em comparação com os 9% anteriormente estimados. O estoque não vai acompanhar nem a inflação, que deve ficar abaixo dos 11%. No início do ano, esperava-se que ao menos mantivesse o ritmo de 2014, quando aumentou 11,3%. As operações de empréstimos não tinham resultado tão fraco desde 2001, quando cresceram meros 2,9%.
A retração econômica, a disseminação do desemprego, a redução da renda, a baixa confiança do consumidor e das empresas e a elevação das taxas de juros desaceleraram o crédito, tanto na ponta da oferta quanto na demanda. Os bancos pisaram no freio, as novas concessões de crédito diminuíram 2,9% neste ano até novembro. As empresas foram especialmente afetadas e enfrentaram cortes de 5%, que incluem o efeito da Operação Lava-Jato. As linhas para pessoas físicas amargaram redução de 0,9%. O receio da inadimplência é geralmente elencado entre os motivos do recuo dos bancos. Apesar de a taxa ter subido ligeiramente para 3,3%, é cerca da metade do registrado em 2012. Nas operações com recursos livremente aplicados pelos bancos chega a 4,5%, sendo de 5,8% entre as pessoas físicas.
O crédito perde fôlego em todas as frentes. Mas chama a atenção a freada dos empréstimos direcionados, como o financiamento habitacional, o rural e as linhas do BNDES, liderados pelos bancos públicos e normalmente lastreados em fundos mais baratos. Os dados divulgados até novembro mostram a forte influência da desaceleração do BNDES, que representa cerca de 20% do crédito no país. Depois de ter ampliado sua carteira de crédito em até 50% em 2009, neste ano, o BNDES aumentou as operações em 8,8% até novembro. A previsão do BC é que o crédito direcionado aumente 10% neste ano, bem menos do que os 19,6% de 2014.
De toda forma, os resultados do crédito seriam ainda mais modestos não fosse a atuação dos bancos públicos. O estoque de crédito cresceu 8% nos bancos públicos neste ano até novembro e 4,4% nos privados estrangeiros, mas diminuíram 0,7% nos privados de capital nacional. A previsão do Banco Central é que as diferenças serão mantidas no fechamento no ano, com expansão de 10% dos bancos públicos, 6% dos estrangeiros e 1% dos privados nacionais.
Os tomadores de crédito também se retraíram diante do endividamento já elevado, juros altos, queda da confiança e da preocupação com o mercado de trabalho. Os juros do cheque especial chegaram a 284,8% nominais ao ano, a taxa mais elevada em pouco mais de 20 anos. Em maio de 1995, estavam em 286,2%, mas, naquele ano, a inflação foi de 22,4%, mais do que o dobro da atual. No cartão de crédito, o juro chega a 415,3%.
Sinal da cautela do tomador de crédito é o fraco interesse apurado pelo Valor (15/12) até mesmo pelas linhas lançadas pelo governo para estimular a economia. Essas linhas tiveram como alvo a construção civil e a indústria automobilística e procuraram incentivar os negócios e os empregos. A linha de crédito de R$ 5 bilhões lançada pela Caixa para financiar a compra de automóveis só teve um quinto dos recursos desembolsados quase quatro meses depois. Também teve efeito limitado o remanejamento de depósitos compulsórios desenhado para estimular o crédito imobiliário e o rural, garantindo funding diante dos crescentes saques na caderneta de poupança, com uma injeção de R$ 25 bilhões. Somente a Caixa teve R$ 10,2 bilhões liberados em compulsórios, mas informa que os recursos serão desembolsados gradativamente.
A experiência esvazia a tese defendida até pelo ex-presidente Lula, de que o governo deveria estimular o crédito para incentivar o crescimento. Esse tipo de movimento teve sucesso no segundo mandato do ex-presidente, quando o crédito cresceu a uma taxa média anual de 24% em um cenário de crescimento econômico e estoque de crédito baixo, equivalente a 35% do PIB. Atualmente, o crédito é de 53,8% do PIB, o país enfrenta a perspectiva de passar o segundo ano consecutivo em recessão e de ver a taxa de desemprego chegar a dois dígitos. O próprio Banco Central já admite que, na melhor das hipóteses, o credito vai repetir o mesmo desempenho no ano que vem.