Talita Moreira
Empurrada por operações de grandes empresas, a segunda metade de 2015 deve ser um pouco melhor para emissões de títulos de renda fixa que o primeiro semestre deste ano - a despeito das más notícias na economia.
De janeiro a junho, as companhias levantaram R$ 46,7 bilhões no mercado local de renda fixa - pouco mais que a metade dos R$ 86,1 bilhões captados no mesmo período do ano passado. Os dados são da Anbima, associação das instituições que atuam no mercado de capitais.
O otimismo nos bancos, porém, já foi bem maior. A redução da meta fiscal anunciada pelo governo, o risco de perda do grau de investimento e a turbulência política podem frear algumas operações.
"O que já estava previsto não muda, mas quem estava aguardando o melhor momento pode preferir esperar mais", afirma o diretor de renda fixa do Bradesco BBI, Mauro Tukiyama. Mesmo assim, ele diz que o segundo semestre "está com uma cara melhor" que a primeira metade de 2015.
Para Ricardo Leoni, diretor-executivo responsável por mercados de capitais de dívida do J.P. Morgan no Brasil, a deterioração do cenário macroeconômico pode ter impacto negativo no mercado local. "Eu estava mais otimista", diz. "Mas não deve ser algo material, a não ser que as coisas piorem mais."
O que ajuda é que devem se destacar, no segundo semestre, operações com isenção de imposto de renda para estrangeiros e pessoas físicas - como as debêntures de infraestrutura. Os grandes compradores desses papéis são os clientes do segmento private (alta renda), "que são menos reativos às turbulências e têm necessidade de alocar recursos", diz Tukiyama.
Também estão no radar operações de volume elevado e de empresas grandes, conhecidas dos investidores. A Vale prepara uma emissão de debêntures de infraestrutura de pelo menos R$ 1 bilhão, como noticiou o Valor na semana passada. A Petrobras pretende captar R$ 3 bilhões, em operação que deve ocorrer por volta de outubro. Comgás, Fibria, CCR e Unidas também planejam acessar o mercado local, segundo fontes a par do assunto.
Empresas de varejo - segmento que não costuma acessar com frequência o mercado de renda fixa - também estariam cogitando a possibilidade de fazer emissões nos próximos meses. Lojas Americanas, Grupo Pão de Açúcar, Riachuelo e algumas redes de drogarias estudam a possibilidade, apurou o Valor.
Grande parte das operações previstas para a segunda metade de 2015 tem como objetivo o refinanciamento de dívidas ou um reforço no caixa das empresas.
Entretanto, não há muita urgência das companhias em acessar o mercado. Tukiyama, do Bradesco BBI, diz que há R$ 12 bilhões em operações vencendo no segundo semestre, mas quase tudo está equacionado.
"Casos de [emissões para fazer] investimentos são menos óbvios", diz Ignacio Lorenzo, superintendente - executivo do Santander. A exceção ficará por conta das debêntures de infraestrutura, cuja emissão tem de estar atrelada a algum projeto.
A expectativa nos bancos que estruturam operações de renda fixa é que debêntures de infraestrutura e outros produtos incentivados, como certificados de recebíveis do agronegócio e do setor imobiliário, continuem a ganhar relevância. "Esses papéis estão se tornando mais usuais, o que atrai mais emissores", diz Carlos Omine, gerente - executivo de mercado de capitais e infraestrutura do Banco do Brasil.
O mercado local de renda fixa ficou praticamente fechado no primeiro trimestre de 2015 diante das incertezas sobre a implementação do ajuste fiscal e das implicações da Operação Lava-Jato, que investiga um esquema de corrupção na Petrobras. As emissões só foram retomadas aos poucos, mas ficaram restritas a companhias já conhecidas pelos investidores e com bom risco de crédito.
A seletividade continuará a dar o tom no segundo semestre. De acordo com Leoni, do J.P. Morgan, os investidores não estão avessos a emissores novos de boa qualidade, mas nomes já conhecidos têm melhores possibilidades. Ele estima que o volume de emissões no mercado doméstico deve fechar 2015 com queda de 35% em relação ao ano passado. Em 2014, as captações totalizaram R$ 141,7 bilhões, segundo a Anbima.