Por Ana Luiza Tieghi
O segmento do programa Minha Casa, Minha Vida (MCMV) tornou-se um refúgio para as incorporadoras, tendo respondido por metade das unidades lançadas nos últimos 12 meses até março, de acordo com a Câmara Brasileira da Indústria da Construção (Cbic). Ele segue atraindo novos negócios, que precisam encontrar um nicho para enfrentar a forte competição no setor.
Com experiência em fundos de investimento de varejo, Paulo Goldsztein fez planos para criar uma gestora, que seria associada a uma grande incorporadora. A empreitada não foi para a frente, mas restou a vontade de empreender no segmento residencial.
Antes de decidir pelo segmento no qual atuar, ele já tinha uma coisa em mente: não queria mais lidar com terrenos grandes, como os necessários para a instalação de grandes varejistas, e como são as áreas buscadas pelas principais incorporadoras do mercado.
Em São Paulo, formar áreas grandes é um exercício de paciência, que pode envolver negociações com dezenas de donos de terrenos, muitos dos quais estão envolvidos em disputas familiares ou possuem problemas de documentação.
Além disso, quanto maior o projeto, maior a quantidade de unidades, o que dificulta a venda, avalia. “Quanto mais rápido você vender e construir, mais sua TIR (taxa interna de retorno) aumenta”, afirma Goldsztein.
O foco do novo negócio, batizado de Arie — leão, em hebraico — é baseado, então, em terrenos considerados pequenos pelo mercado, com no máximo 1.500 metros quadrados.
O segmento popular é para onde o governo tem direcionado seus incentivos. Atuar ali protegeria a nova empresa do momento conturbado no médio padrão, que sofre com os juros altos, e também da concorrência e do capital elevado necessário para atuar no alto padrão.
Uma referência para a Arie é a MagikJC, incorporadora que faz empreendimentos do MCMV na região central da capital, também em terrenos considerados pequenos.
O primeiro empreendimento da Arie, que será lançado em agosto na Lapa, zona oeste da capital paulista, estava orçado para ter um valor geral de venda (VGV) de R$ 40 milhões, mas foi impulsionado por um dos incentivos ao segmento popular: a criação da faixa 4 do MCMV, para imóveis de R$ 350 mil a R$ 500 mil, e famílias com renda de R$ 8,6 mil a R$ 12 mil.
O aumento no teto de preço das unidades permitiu um ganho de R$ 6 milhões em VGV no projeto, sem a necessidade de alterações, conta Goldsztein, do valor nos projetos da nova empresa.
Em um terreno de 480 metros quadrados serão construídas 85 unidades, de 30 a 44 metros quadrados, com um ou dois quartos — a Arie preferiu não fazer estúdios. A previsão é que o preço por metro quadrado fique em torno de R$ 12 mil.
Segundo o empresário, a região da Lapa tem sido pouco explorada pelas grandes incorpordoras. Evitar o embate com as maiores empresas do setor, de capital aberto, é um mote da nova companhia. Com mais caixa, elas podem pagar mais caro pelas áreas e até se “dar ao luxo de errar” em um projeto ou outro, afirma, já que eles pesam, individualmente, menos nos resultados. Não é o caso de uma empresa como a Arie.
Outro incentivo para atuar no MCMV, inclusive, é contar com o financiamento da obra e dos clientes pela Caixa Econômica Federal. Goldsztein diz que tem recebido propostas de fundos, que se oferecem para comprar um terreno ou financiar uma parte do projeto. A comparação do spread pedido nessas operações, que supera 20% ao ano, com os juros da Caixa não deixa muita dúvida para o empresário, no entanto.
Há empresas do segmento econômico que pegam recursos no mercado de capitais, para financiar a compra de terrenos, por exemplo, como um complemento ao crédito do banco público. “A incorporadora antecipa dinheiro, compra outro terreno, desenvolve outro projeto”, explica Goldsztein. “Isso dá certo até o momento em que ela não consegue mais vender, porque se encalhar um projeto, quebra a malha inteira”.
Com os recursos da Caixa, a previsão da Arie é que seja preciso desembolsar apenas cerca de 10% do VGV do projeto em capital próprio.
A companhia deve lançar seu segundo empreendimento em outubro, na Vila Romana, em um terreno de 800 metros quadrados e com 70 unidades.
Até meados do ano que vem, quer ter ao menos mais dois prédios, no Brooklin e na Pompeia. O VGV total desses empreendimentos pode beirar os R$ 400 milhões.