O saldo da poupança ultrapassou a marca de R$ 1 trilhão pela primeira vez desde julho de 2022. Em junho deste ano, o saldo registrado pelo Banco Central (BC) e divulgado nesta sexta-feira foi de R$ 1,01 trilhão.
No primeiro semestre, os saques superaram os depósitos em R$ 2,8 bilhões, número inferior aos R$ 66,6 bilhões que saíram da poupança no mesmo período de 2023. O rendimento de R$ 31,2 bilhões nos primeiros seis meses de 2024 contribuiu para a elevação do saldo da poupança, que passou de R$ 968 bilhões em janeiro para a marca acima de R$ 1 trilhão no fim do primeiro semestre.
O economista-chefe da Austin Rating, Alex Agostini, ressalta que houve uma turbulência no mercado nos meses recentes com, por exemplo, a mudança das metas fiscais e o desastre climático no Rio Grande do Sul, que sinalizam uma cautela ao investidor. Além disso, a Selic mantida em 10,5% ao ano contribuiu para preservar a rentabilidade da poupança. “Com os juros um pouco mais altos e essa cautela por conta de um risco maior no mercado de capitais, os investidores vão momentaneamente para a poupança”, disse.
A rentabilidade da poupança quando a taxa Selic está acima de 8,5% é calculada pela taxa referencial (TR) mais 0,5% ao mês.
Nos últimos anos, o saldo da poupança vem caindo continuamente. Depois de fechar 2021 em R$ 1 trilhão, o saldo chegou a R$ 999 bilhões no final de 2022 e R$ 983 bilhões em dezembro de 2023. Agostini acredita que a tendência é que o saldo volte a cair quando houver mais clareza sobre o cenário econômico. Segundo o economista, houve uma mudança estrutural nos últimos anos com mais investidores escolhendo outros instrumentos no lugar da poupança, como fundos e certificados de recebíveis.
Cristiane Quartaroli, economista-chefe do Ouribank, aponta que esse resultado do primeiro semestre pode estar relacionado também a uma melhora na renda de forma geral, citando que os dados de desemprego e rendimento médio aumentaram. “A gente pode estar vendo uma realocação por conta disso também”.
O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostrou que a taxa de desemprego caiu para 7,1% no trimestre encerrado em maio, menor nível desde 2014. Já a renda média dos trabalhadores subiu 5,6% na comparação com o mesmo trimestre do ano passado.
A poupança passou a registrar resultados mais positivos no final da primeira metade deste ano do que no início. Em janeiro e fevereiro, a saída líquida foi de R$ 24 bilhões, enquanto na soma dos resultados de maio e junho, houve uma entrada líquida de R$ 21 bilhões.
Analisando o resultado do mês de junho, que registrou a maior entrada líquida do ano em R$ 12,8 bilhões, Marcos Moreira, sócio da WMS Capital, avalia que ele pode estar relacionado a uma procura por investimentos que deem sensação de segurança para investidores mais conservadores por conta do cenário de incertezas durante o mês. Moreira afirmou que "ainda existe uma expectativa que não haja uma tendencia de resultados positivos para captação liquida da poupança ao longo do ano”.
A redução nos depósitos da poupança dos últimos anos já vem sendo alvo de preocupação do setor imobiliário por conta do funding para crédito. Em entrevista ao Valor no início deste mês, a vice-presidente de habitação da Caixa, Inês Magalhães, disse que o banco conversava com o Ministério da Fazenda sobre uma permissão para que fundos de previdência faças investimentos em habitação, o que seria uma alternativa ao funding.
Em meio a pedidos do mercado de redução nos depósitos compulsórios, o diretor de fiscalização do BC, Ailton Aquino, disse em junho que a poupança era um desafio “para todos” no momento e “principalmente no que diz respeito a financiamento imobiliário”. Segundo ele, várias coisas estavam postas sobre a mesma e o BC estava avaliando, reafirmando que não haveria prazo para nenhuma medida.
O Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo (SBPE) registrou alta nos primeiros seis meses de 2024. A captação líquida positiva foi de R$ 8,9 bilhões em junho e o saldo chegou a R$ 762,5 bilhões após registrar R$ 734,7 bilhões em janeiro. O SBPE é o sistema que promove financiamento imobiliário com recursos da poupança.
Filipe Pontual, diretor-executivo da Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança (Abecip), disse que a alta no saldo da poupança é uma boa notícia. No entanto, o diretor ressaltou que a velocidade com que o mercado pode crescer com o crédito imobiliário é maior do que a poupança pode crescer e que novos "fundings" continuam sendo importantes. "Notícia boa, ajuda para esse ano, tomara que continue assim, só que a gente não tem como saber exatamente o que vai acontecer neste ano com a poupança".
