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27/05/2022

Projeto que ensina mulheres da periferia a construir as próprias casas é destaque na Bienal Internacional de Arquitetura

Desde 2013, iniciativa criada por arquiteta mineira já atendeu mais de 80 mulheres em comunidades de Belo Horizonte, São Paulo e Rio de Janeiro

Por Raquel Freitas


Para muitas mulheres, chefes de família, sonhar com a casa própria significa desejar uma moradia digna. No entanto, esse direito está longe de ser alcançado por grande parte delas. Há quase dez anos, uma iniciativa criada por uma arquiteta de Belo Horizonte vem ajudando a transformar essa realidade. É o projeto Arquitetura na Periferia, destaque na Bienal Internacional de Arquitetura de São Paulo, que começa nesta sexta-feira (27).

 

"A gente quis levar para a bienal para além do antes e depois das casas. O nosso foco é justamente o processo. Esse processo que é transformador, de aprendizado, de troca de conhecimentos, de se reconhecer como uma pessoa capaz de transformar o seu próprio espaço. E a gente acha que isso tem muito a ver com o tema da bienal, que é Travessias", afirma a arquiteta Carina Guedes.

 

Nesse processo, grupos formados por, em média, por cinco mulheres aprendem a medir, desenhar, fazer cálculos com metro quadrado e a transformar esses números em materiais de construção, como sacos de cimento e de areia.

 

Na sequência desse percurso de transformação e capacitação, estão as oficinas de “mão na massa”, em que são ensinadas as técnicas para construção e reforma. No planejamento, elas contam ainda com oficinas de finanças pessoais.

 

Para as mulheres que não têm condições de arcar com todas as despesas da obra, o projeto também oferece empréstimos. “São pequenas quantias, para coisas mais urgentes, comprar algum material para dar o pontapé inicial naquela melhoria na casa”, explica Carina.

 

A arquiteta diz que a maior parte das mulheres que participam da capacitação almeja dois objetivos principais: conforto e autonomia.

 

“A grande maioria são mães e pensam muito nas crianças, em ter mais conforto, uma vida melhor. E, de certa forma, em ter alguma autonomia. Por mais que sejam chefes de família, na hora de fazer a obra, têm que contratar alguém, que normalmente é homem. E eles acabam tomando as decisões sobre as obras, sobre as casas delas”, pontua.

 

A ideia de criar o projeto veio a partir de uma inquietação, quando Carina cursava o mestrado na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). “Por que a arquitetura é tão inacessível para tantas pessoas?”, questionava-se.

 

Em busca dessa resposta, desde 2013, o Arquitetura na Periferia já capacitou mais de 80 mulheres de comunidades como Dandara, Eliana Silva e Paulo Freire, em Belo Horizonte, Palhereiros, em São Paulo, e Complexo da Maré, no Rio de Janeiro.

 

Carina destaca que, para a manutenção do projeto, a doação de voluntários é essencial. Hoje, a iniciativa conta com seis arquitetas, quatro estudantes, duas agentes locais, uma instrutora, uma monitora, além de equipe de psicologia, assistência social e comunicação.

 

“É uma sensação de que a gente está no caminho certo porque são mulheres que já carregam muita coisa na vida delas. Elas que resolvem tudo na família, na casa, na vida. E vê-las sentindo capazes de resolver essas questões que afetam diretamente a vida delas, que é o conforto da casa, é muito bom. É realmente uma sensação de caminho certo e de que a gente, a mulher, precisa se fortalecer”, afirma.

 

Matéria publicada em 27/05/2022 

FONTE: G1