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07/06/2019

Para driblar a nova lei: construtores antecipam projetos para fugir do novo Plano Diretor de BH

Hoje, em um lote de mil metros quadrados, por exemplo, podem ser construídos 2,7 mil metros, em uma relação de 1 x 2,7

As discussões do novo Plano Diretor de Belo Horizonte, aprovado ontem pela Câmara Municipal, e a consequente criação da outorga onerosa — contrapartida que empresas terão que pagar à prefeitura se quiserem expandir empreendimentos além do coeficiente 1.0 — provocaram uma antecipação dos empresários para aprovar empreendimentos antes da alteração da legislação.

Ao unificar o coeficiente de potencial construtivo para 1.0 na cidade inteira, a prefeitura afirma que pretende frear a especulação imobiliária e ajudar a descentralizar o município, contribuindo para uma verticalização menos agressiva da cidade e, ao mesmo tempo, promovendo uma expansão além da avenida do Contorno.

Hoje, em um lote de mil metros quadrados, por exemplo, podem ser construídos 2,7 mil metros, em uma relação de 1 x 2,7. O novo Plano Diretor propõe que, neste mesmo lote, o construtor possa erguer apenas mil metros quadrados, reduzindo a relação para 1 x 1. Caso exceda esse potencial, o empresário deve pagar uma contrapartida à prefeitura.

As construtoras, além de considerarem o pagamento da contrapartida um novo imposto, alegam que as regras do novo Plano Diretor reduzem, de imediato, drasticamente o potencial construtivo dos empreendimentos, sem estabelecer, na prática, um período de carência. Pela redação do texto, todas as partes de uma construção serão contabilizadas automaticamente no Coeficiente de Aproveitamento (CA) – que delimita a área máxima passível de ser construída em um terreno.

A versão atual do Plano Diretor, de 1996, e a Lei de Uso e Ocupação do Solo estabelecem que pilotis, garagens, áreas de lazer e escadas e elevadores não são contadas como áreas construtivas.

Segundo o advogado Kênio Pereira, presidente da Comissão de Direito Imobiliário da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-MG), por causa da regra atual, empreendimentos conseguem, em média, ultrapassar em até seis vezes o potencial construtivo inicial

“Escadas, pilotis e áreas de garagem podem representar até 40% da construção. Com essa restrição, obviamente as construtoras vão erguer menos unidades habitacionais. Por isso, muitas construtoras se anteciparam para iniciar projetos, antes da aprovação do Plano Diretor, e conseguir se enquadrarem na atual legislação”, avalia Kênio.

É o caso do empresário Luís Flávio Albuquerque, proprietário da Construtora Alturez. Ele se apressou para comprar dois lotes com área total de 1.260 m² na rua Sergipe, na Savassi, onde serão erguidas duas torres com 46 apartamentos.

Apesar de o Plano Diretor prever uma carência de até três anos para implementar o coeficiente 1.0 unificado na cidade — permitindo que os empresários construam acima do limite sem pagar outorga onerosa nesse período —, as regras para considerar todas as partes da construção dentro do Coeficiente de Aproveitamento (CA) — incluindo áreas de lazer, escadas e garagens — entram em vigor assim que o texto for sancionado pelo prefeito Alexandre Kalil.

Por isso, Luís Flávio se adiantou para conseguir o alvará de construção na prefeitura e, com isso, poder construir dentro da legislação atual. “Sabemos que existe um período de carência para a implemen-tação do coeficiente 1.0, mas não existe carência para considerar as partes de uma construção como área construída. Se eu não tivesse me apressado, com a aprovação do plano, provavelmente teria que reduzir os apartamentos pela metade e cortar uma das duas garagens”, diz o empresário.

“O Plano Diretor é bom para a cidade, acredito até que na região Centro-Sul e na Contorno não seja possível tantas pessoas morando. Mas vai prejudicar as construtoras”, completa Luís Flávio.

 

Depois de três anos de discussões, projeto é aprovado em sessão tensa na Câmara

Após uma discussão de três anos, o Projeto de Lei 1.749/15, que implanta o novo Plano Diretor de Belo Horizonte, foi aprovado ontem na Câmara Municipal por 35 votos favoráveis e 5 votos contrários, em uma sessão plenária lotada e com clima tenso entre empresários e movimentos sociais.

O acordo para a aprovação do substitutivo nº 2 do PL só foi possível após o vereador Gabriel Azevedo (PHS), que vinha obstruindo a pauta da Casa ao protocolar milhares de requerimentos para atrasar a votação, ceder e propor um acordo com o líder do governo, o vereador Léo Burguês (PSL).

“O governo concordou em ceder e inseriu sete emendas minhas que estavam excluídas. Pela flexibilização, decidimos parar de obstruir a pauta porque houve diálogo”, disse o vereador do PHS.

Apesar disso, Léo Burguês disse que o prefeito ainda irá analisar os vetos possíveis. “A decisão de vetos é do prefeito. Foram acolhidas 106 emendas sem olhar o vereador que estava propondo. O critério foi o melhor para a cidade”, disse Burguês. O projeto agora segue para a sanção do prefeito Alexandre Kalil (PHS), que tem prazo de 30 dias para apontar os eventuais vetos ao texto.

Além de estabelecer o coeficiente 1.0 e prever a outorga onerosa – com uma isenção especial para templos religiosos –, outra polêmica do substitutivo n° 2 é a não inclusão da Vila Dias na Área de Diretrizes Especiais (ADE) do Santa Tereza, para evitar possíveis especulações imobiliárias no tradicional bairro.

Os vereadores também aprovaram um subemenda que transforma a Área Especial de Interesse Social (AEI) da Vilarinho em ocupação moderada de nível 3. Já a Zona Especial de Interesse Social (ZEI) do bairro Santo André passa a ser ocupação moderada 2. Na prática, as duas regiões poderão ter aumento de coeficiente de construção.

“Vamos lutar para vetar essa emenda e proteger mais as áreas de interesse social. Mas, no geral, o plano contempla bem as áreas verdes e regulamenta a outorga onerosa, que vai ajudar a financiar a construção de moradias populares”, disse a vereadora Bella Gonçalves (Psol).

 

Apartamentos ficarão até 35% mais caros e menores, afirma diretor do Sinduscon-MG

Por causa da mudança no coeficiente de aproveitamento do terreno, o Sindicato da Indústria da Construção Civil no Estado de Minas Gerais (Sinduscon-MG) projeta uma inflação entre 30% e 35% nos imóveis da capital mineira com a aprovação do Plano Diretor.

Apesar de não determinar quando esse aumento será repassado ao consumidor final, o diretor da Área Imobiliária do Sinduscon-MG, Ricardo Catão, diz que é “inevitável” o reajuste, devido às condições colocadas pelo Plano Diretor.

“Esse período de carência foi uma desculpa da prefeitura para dizer que as mudanças não serão imediatas. Todo mundo que tem projetos com terrenos em Belo Horizonte está se antecipando para salvaguardar seus direitos. Mas, com a aprovação, é fato: a área dos apartamentos vai diminuir, e a qualidade de vida também. Não tem outra saída”, disse Ricardo Catão.

Procurada, a Prefeitura de Belo Horizonte informou, inicialmente, por meio da assessoria de comunicação, que não havia aumento na demanda por registros de novos empreendimentos por conta do novo Plano Diretor.

A reportagem também questionou a Subsecretaria Municipal de Regulação Urbana sobre o número de pedidos de alvará de construção protocolados na pasta neste ano. Às 17h de ontem, a assessoria de imprensa da Subsecretaria Municipal de Regulação Urbana respondeu que os dados poderiam ser consultados no site da prefeitura, no campo que trata do pedido de registros de novas edificações na capital.

As planilhas disponíveis, no entanto, não permitiram concluir, até o fechamento desta edição, se houve ou não aumento na demanda por novos empreendimentos.

 

FONTE: HOJE EM DIA