Domingos Zaparolli, Ediane Tiago e Jacílio Saraiva
As concessões de infraestrutura e as Parcerias Público-Privadas (PPPs) são as principais apostas para um novo ciclo de expansão das atividades na construção civil. É o que se constata entre as manifestações de empresários, executivos e consultores reunidos na última semana, em Foz do Iguaçu (PR), pela Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC) em debate sobre os desafios e as oportunidades para o setor nos próximos anos.
"Vivemos um momento de aperto nos orçamentos das famílias e também dos governos, restringindo a demanda no mercado imobiliário e de obras públicas. Mas o estímulo aos investimentos privados em infraestrutura pode reativar a economia", diz José Carlos Martins, presidente da CBIC.
Martins vê como sinalização positiva o fato de o presidente interino Michel Temer dedicar sua primeira medida provisória, a MP 727, ao estímulo do investimento privado em infraestrutura. A medida criou o Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), que autoriza o BNDES a constituir o Fundo de Apoio à Estruturação de Parcerias, com poder de contratar empresas, profissionais e entidades para realizar os estudos prévios de viabilidade de concessões e PPPs.
De acordo com Gesner de Oliveira, sócio da GO Associados, o setor de construção civil pode fazer parte de uma estratégia anticíclica, se o novo governo demonstrar capacidade para atrair a iniciativa privada às obras de infraestrutura. "Existe uma demanda reprimida e bons projetos que interessam ao investidor", diz.
A segunda etapa do Plano de Investimento em Logística (PIL 2015-2018), lembra o consultor, anunciado em 2015, relaciona obras que somam R$ 198,4 bilhões em rodovias, ferrovias, portos e aeroportos. "Deste total, há uma carteira de R$ 70 bilhões em projetos que já estão no radar dos investidores", diz Oliveira.
O consultor avalia que esse valor pode gerar um impacto no PIB de R$ 217 bilhões, com geração de 4,1 milhões de empregos e arrecadação fiscal na casa de R$ 14 bilhões. O momento é favorável para o país destravar esses investimentos. "Hoje as taxas de retorno para o investidor no exterior são baixas, o que amplia a atratividade dos projetos brasileiros, que apresentam taxas maiores."
Segundo José Carlos Martins, além desses projetos, há um total de 400 PPPs estaduais e municipais para obras de saneamento, iluminação pública, construção de escolas, hospitais e prisões com potencial de sair do papel no curto prazo. "São obras que geram oportunidades para construtoras de porte médio e pequeno."
A instabilidade política e a desaceleração econômica geraram forte impacto na indústria de construção. 2016 será o terceiro ano de retração nas atividades do setor. Em 2015, enquanto a economia recuou 3,8%, o PIB da construção caiu 7,6%. Para 2016, o Sindicato da Indústria da Construção de São Paulo (Sinduscon-SP), projeta queda de 5%.
No primeiro trimestre, a atividade de construção imobiliária caiu 9,3% em relação ao mesmo período de 2015 e as vendas de unidades foram 17% menores. No primeiro bimestre, a contratação de crédito imobiliário recuou 58% e os empregos com carteira assinada, 14%. "Não há novos empreendimentos para absorver as estruturas desmobilizadas pelas obras encerradas", diz José Romeu Ferraz, presidente do Sinduscon-SP.
Haru Ishikawa, dono da construtora paulista que leva seu nome, diz que fez uma pausa em alguns lançamentos residenciais, por conta da crise, mas continua entregando obras contratadas. "2015 não foi um ano bom e 2016 deve ser igual", afirma o empresário, há 35 anos no mercado.
No ano passado, entregou dois prédios e, até dezembro, conclui uma torre de 12 andares, com 72 unidades de 42 metros quadrados cada uma, no bairro paulistano da Saúde. Custavam, em média, R$ 400 mil, e todas foram vendidas em dois meses. "Mesmo assim, vou observar a mudança do humor da população antes de lançar outro edifício, com 64 apartamentos, na mesma região."
No mercado imobiliário, a expectativa dos empresários está na continuidade - e reforço orçamentário - do Programa Minha Casa Minha Vida. "O impacto do programa no PIB e na geração de empregos é evidente", diz Ana Maria Castelo, coordenadora geral da Fundação Getulio Vargas (FGV).
Estudo coordenado por Ana Castelo, demonstra que por meio do programa, até o fim de 2015, foram contratadas 4,157 milhões de unidades habitacionais, envolvendo R$ 287,8 bilhões em recursos. Os subsídios somaram R$ 115,8 bilhões. Ao todo cinco milhões de postos de trabalho foram criados. "Boa parte dos subsídios cedidos pelo governo federal retornaram aos cofres públicos na forma de impostos. O programa é sustentável", destaca Ana.
O estudo estrutura a argumentação do mercado imobiliário, sufocado pela queda nas vendas de unidades habitacionais, que prega a continuidade do programa. "Tem de virar uma política de Estado para reduzir a insegurança dos construtores", diz Flávio Prando, presidente da comissão da indústria imobiliária na CBIC. Segundo ele, a possível suspensão da fase 3 do programa causa sérios impactos no segmento. "As empresas estruturaram-se para atender à demanda. Agora sofrem com a falta de definição e de orçamento", diz.
A terceira fase do programa, lançada em março, prevê a contratação de mais de dois milhões de moradias até 2018. Ao todo, estão previstos R$ 210,6 bilhões em investimentos, sendo R$ 41,2 bilhões do Orçamento Geral da União. Com a mudança de governo, os empresários temem que os desembolsos não sejam mantidos. Entre as alternativas, está a utilização de recursos do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS). "O fundo tem orçamento para habitação e pode atuar na continuidade do Minha Casa Minha Vida", diz Maria Henriqueta Alves, consultora técnica da CBIC.
A disponibilidade de recursos públicos para programas de investimentos, porém, é reduzida, afirma Cláudio Frischtak, presidente da Inter.B Consultoria Internacional de Negócios. "Estamos diante de um desastre fiscal." O consultor lembra que o déficit nominal do país, em março, chegou a 9,73% do PIB e o déficit primário chegou a 1,8% do PIB. "A dinâmica da dívida pública é explosiva, passará dos 80% do PIB nos próximos anos", diz.
Frischtak diz que será preciso aceitar um ajuste fiscal. "Sem ele, não há possibilidade de reverter o quadro." Na avaliação do consultor, um empenho bem sucedido do governo federal para estabilizar a dívida pública, conter a alta do desemprego e retomar o crescimento, pode levar a economia de volta ao crescimento a uma taxa de 1% no próximo ano e ao "ritmo normal" a partir de 2018.
Se a reestruturação política e econômica acontecer, o país estará pronto, segundo o economista, para surfar o próximo ciclo de expansão global, que deve ser comandado pela Índia.