A Câmara dos Deputados voltou do recesso no início deste mês com o debate sobre a remuneração das contas vinculadas do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS). Em pauta, o principal tema são os meios para rever a correção do benefício, considerado uma espécie de poupança forçada que todos os trabalhadores são obrigados a fazer.
O FGTS foi criado em 1967 como alternativa à regra que tornava o trabalhador estável após 10 anos de empresa e é constituído por contas vinculadas abertas em nome de cada trabalhador. Os empregados depositam 8% do salário todo mês. Em caso de demissão, aposentadoria ou compra da casa própria, os recursos podem ser sacados. A remuneração do FGTS é corrigida pela Taxa Referencial (TR) mais juros.
O Projeto de Lei 1.358/2015 propõe que o dinheiro depositado no fundo tenha uma remuneração igual à da poupança, de 6%. A nova taxa, se aprovada, valerá para os depósitos feitos a partir de 2016. Hoje, os recursos são remunerados a 3% ao ano, abaixo dos índices de inflação, o que motivou trabalhadores a recorrerem à Justiça pedindo a troca da TR por um indicador inflacionário.
A questão é que os recursos do FGTS se tornaram uma das principais fontes de financiamento habitacional, especialmente para as famílias de baixa renda, como os beneficiários do programa Minha Casa Minha Vida. Contudo, diz a contadora Marice Fronchetti, o fundo não foi criado com essa finalidade. "O FGTS deve ser usado para a segurança do trabalhador e não deveria ser visto pela União como parte do seu orçamento", lembrou Marice.
A sócia da empresa de consultoria contábil e empresarial Proceconta concorda que talvez esse não seja o melhor momento para aplicar uma mudança com impacto nas contas. "Talvez o melhor fosse deixar para colocá-lo em prática a partir de 2017, desde que até lá o governo federal fizesse uma reflexão sobre como o fundo deve seguir sendo usado", salientou.
Segundo Marice, o governo federal lucra com a utilização do FGTS como a maior fonte de recursos para a construção de habitação popular e saneamento básico. "Ele repassa apenas 3%, mas obtém um ganho muito superior com o financiamento imobiliário", ressaltou.
Contudo, o Fundo de Investimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço - FI-FGTS, criado por autorização da Lei nº. 11.491, de 20 de junho de 2007, prevê a valorização das cotas por meio da aplicação de seus recursos na construção, reforma, ampliação ou implantação de empreendimentos de infraestrutura em rodovias, portos, hidrovias, ferrovias, energia e saneamento.
O aumento da remuneração do dinheiro depositado no FGTS elevaria, segundo a Caixa, em até 38% os juros das parcelas dos empréstimos da casa própria. As taxas de habitação com os recursos do FGTS, por volta de 4,5% ao ano, seriam impraticáveis caso a remuneração subisse para 6% ao ano.
De acordo com a Caixa, responsável pela administração do fundo, a parcela de um financiamento de R$ 75 mil subiria de R$ 527,00 para R$ 726,00, aumento de quase 38%. Se o financiamento for de R$ 97 mil - o mais usado -, a prestação subiria de R$ 762,00 para R$ 1.019,00, ou 34% de aumento. Haveria também impacto no custo dos financiamentos de infraestrutura e saneamento. A votação do PL 1.358 depende da liberação da pauta ordinária do Plenário, que está trancada por dois projetos de lei do Executivo sobre o combate ao terrorismo que estão com a urgência constitucional vencida.
Entidades da construção propõem alternativa aos projetos de lei - Os representantes do setor da construção civil divergem do projeto de lei que aproxima a remuneração dos depósitos dos trabalhadores no FGTS aos proventos da poupança, para as contas abertas a partir de janeiro de 2016. A expectativa do setor, conforme nota da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), é construir um acordo que aperfeiçoe o projeto original, tornando viável a melhoria da remuneração do trabalhador sem impor efeitos negativos que comprometam o modelo do FGTS.
A entidade teme que as alterações esvaziem programas de grande alcance social, como o Minha Casa Minha Vida, e obras de saneamento e mobilidade urbana. Para o presidente do Sinduscon/RS, Ricardo Sessegollo, a proposta inicial de aumento na correção do FGTS inviabilizaria a construção social no Brasil. ?"Corre-se o risco de acabar com a construção social no Brasil. Não há outra forma de manter o modelo atual em que o comprador paga juros de apenas 5,5%", defende Sessegolo.