Rejane Aguiar
A isenção de Imposto de Renda (IR) foi o diferencial que desviou a atenção dos investidores para as letras bancárias com lastros imobiliários e agrícolas - as LCIs e LCAs - nos últimos anos. Com bom retorno e praticamente sem risco para investimentos de até R$ 250 mil por CPF (contam com cobertura do Fundo Garantidor de Crédito-FGC), os papéis impulsionaram a renda fixa e se tornaram fortes concorrentes dos fundos de investimento.
Mas a festa parece estar no fim: com o cenário econômico adverso, os lastros para novas operações escassearam e, consequentemente, as taxas baixaram. "O cenário mudou de tal forma que o investidor pode encontrar no mercado CDBs com retornos equivalentes ou até mais altos do que os das LCIs", afirma Sandra Blanco, consultora de investimentos da Órama. As taxas hoje giram em torno de 85% do CDI, depois de já terem ultrapassado 90%. A recuperação desse mercado, dizem os analistas, passa necessariamente pela reativação da economia.
O reflexo da reviravolta aparece nas estatísticas. Segundo dados da Cetip, as emissões de LCIs entre janeiro e março deste ano caíram 27,3% em relação a igual período de 2015, enquanto as novas operações para LCAs diminuíram 39,2%. Os estoques no fim do trimestre aumentaram (13,5% no caso da LCI e 26,9% no da LCA), mas em um ritmo menos intenso do que vinha sendo registrado.
LCIs e LCAs são papéis cuja emissão depende de uma operação calcada na economia real que possa servir de lastro. Para as LCIs, os lastros vêm dos empreendimentos imobiliários, que precisam de recursos para garantir o andamento das obras. Com a economia em recessão, no entanto, o setor imobiliário é um dos mais atingidos. "A atividade fraca faz com que menos pessoas comprem imóveis. Ao mesmo tempo, os bancos ou fecham as portas do crédito ou aumentam as exigências para liberar o dinheiro", comenta o gerente de renda fixa da Guide Investimentos, Bruno Carvalho.
Sem novos empreendimentos, os lastros ficam mais raros. "A crise paralisa os negócios no setor, e isso não deve se resolver tão cedo", acrescenta o sócio-diretor da Integral Investimentos, Carlos Fagundes, destacando que, a despeito desse ambiente, os clientes continuam interessados nesses papéis isentos.
Além de igualmente enfrentarem a economia parada, as LCAs se adaptam a recentes mudanças regulatórias (prazo menor e maior exigência para destinação ao crédito rural). Com isso, o funil para os lastros ficou ainda mais estreito. "De qualquer maneira, a perspectiva para as LCAs é melhor, já que o agronegócio é um dos poucos setores da economia hoje com alguma movimentação", avalia Carvalho, da Guide.
O diretor de gestão da Tag Investimentos, André Leite, vê um lado positivo nesse cenário. "Os bancos públicos diminuíram sua participação, o que contribui para um equilíbrio saudável. Oferecendo taxas boas e alta liquidez, eles acabavam distorcendo o mercado. Afinal, taxa alta com liquidez diária não existe", afirma. Segundo ele, hoje as ofertas de LCIs e LCAs estão mais concentradas nos bancos privados médios.
Quem procura LCIs e LCAs normalmente é conservador. Mas, diante da falta de papéis, já não são poucos os investidores que se arriscam no crédito privado. Vedetes desse mercado nos últimos dois anos têm sido os Certificados de Recebíveis do Agronegócio (CRAs), títulos também isentos de IR emitidos por securitizadoras com base em recebíveis de empresas que têm alguma ligação com o agronegócio.
As operações tentam compensar o risco com retornos atraentes, que podem até passar um pouco de 100% do CDI, dependendo da empresa dona dos recebíveis que servem de lastro. Trata-se, entretanto, de um investimento que exige mais cuidado do aplicador: ele precisa conhecer e avaliar o risco de crédito da empresa e lembrar que, nesse caso, não está protegido pelo FGC. Com a seca de LCIs e LCAs, todavia, muitos investidores já consideram essa nova possibilidade, agora no mercado de capitais. Não foi à toa que o estoque de CRAs saltou 143% entre março de 2015 e março de 2016.