Soluções criativas e retomada de velhos hábitos para estimular a compra de imóveis voltaram ao radar das construtoras. A redução de 40% na venda de imóveis e os altos estoques levaram empresas a firmarem parceria com bancos, aceitarem carros no pagamento, estimularem o uso de consórcios e dar descontos que vão além da simples "promoção".
De acordo com o balanço mais recente do Sindicato da Habitação de São Paulo (Secovi-SP), só na capital são 28 mil imóveis em estoque. A média histórica são 17 mil; no Rio de Janeiro, cerca de 14 mil imóveis novos não foram vendidos, enquanto 5 mil residências estão fechadas em Belo Horizonte, segundo dados do Secovi de cada região.
"A era da promoção acabou. Investir em publicidade e dar pequenos descontos é funcional quando o setor vai bem e a construtora só precisa driblar a concorrência. Agora, é hora de driblar a economia ruim e liquidar estoques, e aí as vantagens precisam ser maiores", diz o professor de macroeconomia e doutor em ocupação urbana da Universidade Estadual Paulista (Unesp), Roger Tinto.
A visão do acadêmico vem em linha com as ações das construtoras para eliminar estoques. Na Trisul, por exemplo, além de oferecer financiamento próprio da construtora para compras de imóveis novos, a empresa dá benefícios como viagem de lua de mel, um ano de compras, um ano de escola ou um ano de personal fitness. "A restrição de crédito e maior endividamento das famílias tem restringido a compra, tornando a decisão um pouco mais lenta. O perfil de consumidores tem sido de usuários finais do imóvel. O perfil investidor tem sido mais raro", diz o coordenador de inteligência da Trisul, Lucas Araújo.
Carros no foco - Além dos descontos, quem também tem apostado em vantagens ao consumidor é construtora MBigucci, que opera na região da Grande São Paulo. Segundo Milton Bigucci, presidente da empresa, a construtora adotou ações para movimentar as vendas. "Temos a campanha de venda direta com a construtora, em que o cliente tem menos burocracia para aprovar e fazer os pagamentos. Além da agilidade na compra, outra vantagem é pagar em até 150 meses"
Outra ação da construtora é a campanha do Seu automóvel = sua casa, que aceita carro usado como parte do pagamento. Além disso, a promoção Indique um Amigo, em que o cliente que indicar um novo comprador ganha uma TV de 32 polegadas. "15% das vendas feitas pela construtora nos últimos meses foram indicações de clientes", completou o executivo. "As palavras de ordem na empresa são: flexibilidade e negociação"
Outra ação, explicou ele, é a compra direta com a construtora. "Fazemos uma simulação com a renda e condições de pagamento que o cliente tem. Por não ter vínculo com bancos, o processo é todo aqui, sendo menos burocrático e mais ágil", disse, lembrando que a perspectiva é que o mercado fique de lado este ano, mas cresça em 2016.
Pacotes especiais - Entre as maiores construtoras do Brasil, a PDG também aumentou esforços para estimular a venda. "Com base no atual cenário econômico, criamos o PDG Facilita, pacote especial para 69 empreendimentos, entre comerciais e residenciais, localizados em diversas cidades brasileiras", explicou o gerente de marketing da empresa, Leonardo Garcia Raymundo,
Entre as vantagens estão descontos especiais, parcela única bonificada, financiamento de até 80% do valor contratado, caso o financiamento bancário não atinja o necessário para aquisição. "Além disso, fazemos o Recompra Certa, em que a PDG recompra o imóvel PDG pelo mesmo preço pago pelo cliente, caso o financiamento não seja aprovado pelo banco."
Este mês a Eztec anunciou que estuda ampliar o financiamento próprio para alguns empreendimentos como reação a fraqueza do setor imobiliário. Cerca de R$ 100 milhões seriam necessários para segurar os financiamentos e diminuir os estoques que em março foram avaliados em R$ 1,26 bilhão.
Os financiamentos da empresa teriam prazo de 150 meses, com taxa de 9,99% ao ano mais inflação pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), mediante entrada de 20% do valor do imóvel. "Agora o foco é trabalhar com a nossa imobiliária própria toda a venda de estoques", disse o diretor financeiro e de Relações com Investidores, Emílio Fugazza.
Parceria com bancos - Também de olho na redução de estoques, a construtora Reggon, do Rio Grande Sul, apostou na parceria com bancos para tentar encontrar taxas menores. Segundo o diretor comercial da empresa, César Lemos Brandão, novas taxas serão anunciadas em breve. "Estamos em processo de finalização de uma parceria com um dos maiores bancos do Brasil. O objetivo é reduzir pelo menos dois pontos percentuais o valor do juro praticado no mercado com a garantia da construtora nos financiamentos", disse ele, sem revelar o nome da instituição financeira envolvida no projeto.
Na construtora Marques, entender a necessidade do cliente e achar a melhor forma de financiar vêm sendo a aposta para garantir a venda. De acordo com o diretor comercial do grupo, Rodrigo Ramos de Oliveira, especialistas em crédito imobiliário estudam caso a caso as propostas dos clientes em potencial. "Não oferecemos, de maneira generalizada, financiamento próprio, mas em alguns casos específicos essa modalidade pode sim ser considerada uma opção", disse.
Imóveis usados - Com a mudança em maio dos tetos de financiamento da Caixa Econômica Federal para imóveis usados (50% do valor de imóveis usados sejam financiados pelo Sistema Financeiro de Habitação, SFH, ou 60% pelo Sistema Financeiro Imobiliário, SFI), a Rodobens Consórcio lançou o Plano Hora Certa Imóveis. "Com prazos diferenciados e uma faixa de crédito atrativa é uma alternativa para a compra. Com ele, os consorciados ainda podem acelerar a aquisição do imóvel antes da contemplação", diz o diretor da Rodobens Consórcio, Ronald Macedo Torres.
O Plano Hora Certa Imóveis reúne 600 participantes por grupo. Oferece créditos de R$ 70 mil a R$ 300 mil e prazo de até 180 meses. São realizadas três contemplações mensais, e os consorciados podem aumentar o crédito em até 30% no momento da contemplação. O plano permite que o FGTS seja utilizado para realização de lance ou complementar o crédito.
"Por não necessitar de entrada e ter flexibilidade nos prazos, temos a perspectiva de que o consórcio será uma ferramenta cada vez mais utilizada, e este novo plano estimula essa movimentação", diz Ronald Macedo Torres, diretor da Rodobens.