Por Ana Paula Branco
Uma combinação de preços competitivos, crescimento populacional acima da média nacional e orla preservada por regras urbanísticas transformou João Pessoa (PB) em um dos destinos mais promissores para o mercado imobiliário no Brasil. Incorporadoras e investidores afirmam que a capital paraibana tem valorização acelerada em imóveis residenciais e há fôlego para ainda mais nos próximos anos.
Em 12 meses, até abril, os preços residenciais subiram 18,25%, de acordo com o índice Fipezap —quase o dobro da média nacional. A cidade já havia estado no pódio do ranking de valorização em 2024, apresentando uma alta de 15,54% no preço médio dos imóveis, atrás apenas de Curitiba (PR) e Salvador (BA). Para 2025, a expectativa é que essa valorização se mantenha entre 15% e 20%.
"Estamos vivendo um crescimento de China", afirma André Penazzi, fundador e CEO da incorporadora Setai. Para o empresário, o mercado não demonstra sinais de uma bolha imobiliária, pois o crescimento tem sido gradual e a oferta de novas unidades se mantém em equilíbrio, com uma queda de 34% nos lançamentos no primeiro semestre.
Um dos principais motores dessa valorização é o importante crescimento populacional. O Censo de 2022 do IBGE revelou que João Pessoa foi a capital que mais cresceu entre as 20 mais populosas do Brasil, com um aumento de 15,3% em 12 anos. A Paraíba, inclusive, foi o único estado do Norte e Nordeste a registrar acréscimo populacional nesse período.
Essa migração vem de regiões como Sul, Sudeste e Centro-Oeste, com novos moradores incluindo profissionais que adotaram o home office e aposentados em busca de tranquilidade.
"Hoje, de 60% a 70% das nossas vendas são para 'não paraibanos' que estão descobrindo a cidade", afirma Leonardo Bronzeado, sócio da Eco Construtora.
Apesar da valorização, o metro quadrado em João Pessoa ainda é considerado competitivo, especialmente em comparação com grandes centros. O preço varia entre R$ 20 mil e R$ 25 mil para apartamentos à beira-mar e entre R$ 12 mil e R$ 17 mil para imóveis próximos à praia. Para imóveis de alto padrão, os valores são três vezes menores que em São Paulo, onde chegam a R$ 45 mil ou R$ 70 mil.
Essa atratividade, somada à escassez de terrenos —especialmente na orla, onde o preço de aquisição pode representar até 40% do VGV (Valor Geral de Vendas)— tem impulsionado o mercado.
“Vendemos à beira mar com um metro quadrado entre R$ 16 mil a R$ 25 mil, o que seria inviável em cidades como o Rio de Janeiro”
André Penazzi
CEO da Setai
"Com o crescimento da demanda externa, mesmo com o aumento do valor do metro quadrado —que ainda é inferior ao dos grandes centros urbanos do país— o ritmo de investimentos aumentou. Isso também ampliou a procura por apartamentos menores, que antes não eram tão valorizados", diz Bronzeado.
"A classe média realmente tem sentido o impacto da valorização dos imóveis. O que temos observado é que pessoas que antes só aceitavam apartamentos de 110 m² já estão optando por unidades de 80 m². Da mesma forma, quem buscava 80 m² hoje aceita 50 m²", afirma o construtor.
Muitas vendas, especialmente para investidores de fora, ocorrem à distância, com o uso de videoconferências. A Setai, por exemplo, chegou a vender 100% de empreendimentos no dia do lançamento, sem que a maquete física estivesse pronta.
E entre os incorporadores, muitos são iniciantes no ramo. Essa nova dinâmica tem impulsionado o financiamento por meio mercado privado de capitais. A fintech Makasí, por exemplo, já alocou R$ 110 milhões para financiar projetos em João Pessoa, impulsionando pequenos e médios construtores, muitos dos quais nunca haviam buscado crédito antes.
"O modelo tradicional já não comporta o ritmo de crescimento atual. E o mercado de João Pessoa trabalha com pequenos investidores", analisou Eduan Guérios, sócio e head de growth da Makasí.
"Eles [incorporadores] estão aproveitando o boom do mercado, mas operam com margens muito apertadas, o que eleva os desafios financeiros", diz Guérios.
Dados da Makasí apontam que os projetos típicos em João Pessoa, são de médio padrão, consistindo em aproximadamente 80 unidades residenciais com cerca de 5.000 m² de construção e exigindo um crédito médio de R$ 15 milhões por empreendimento, com um VGV médio de cerca de R$ 90 milhões.
Uma característica do mercado de João Pessoa é que ele é amplamente dominado por empreendedores locais, familiares, com 87% utilizando capital próprio e muitos acessando crédito estruturado pela primeira vez.
Mais de 50% das vendas de imóveis de alto padrão são para pessoas de outros estados, principalmente de São Paulo, Brasília e Rio de Janeiro, que buscam uma segunda residência ou investir para locação, diz Penazzi. Segundo ele, 30% dos compradores de construções na orla são investidores que adquirem imóveis para locação em pool.
"Eu diria que principalmente Rio de Janeiro, São Paulo e Brasília têm sido os principais compradores, mas hoje, particularmente depois de toda essa diferença climática que tem acontecido no Sul do Brasil com frio muito forte ou com enchentes, é impressionante como a gente tem vendido para o pessoal de lá e também do agronegócio", afirma o CEO da Setai.
Há ainda uma maior procura por apartamentos menores e compactos, como lofts (20 a 35 m²), muitas vezes com alto padrão de qualidade, localização privilegiada e até com assinatura, como da Pininfarina.
Hoje, o pessoense aceita morar em um apartamento menor, desde que receba um alto padrão de qualidade e uma localização privilegiada, alinhada aos novos fluxos de crescimento da capital
Leonardo Bronzeado
sócio da Eco Construtora
Marcelo Fam, CEO da Alliance, afirma que a presença dos compradores e investidores de fora da cidade eleva o sarrafo para as construtoras. "É um perfil muito exigente, se a gente não tiver um produto à altura, a gente não consegue abraçar esse grupo tão importante", ele diz.
O mercado, no entanto, não se restringe ao alto padrão. No segmento popular, o Minha Casa, Minha Vida mantém relevância, com unidades entre R$ 250 mil e R$ 350 mil. Neste caso, o financiamento é com a Caixa. A MRV dedica todo o seu estoque na Paraíba ao programa.
"Percebemos que a capital paraibana está sendo muito procurada como residência futura de muitas famílias. Além disso, os jovens nos procuram bastante para a compra do primeiro imóvel", diz Pedro Farias, gestor comercial da MRV na Paraíba.
A cidade é elogiada por sua infraestrutura, segurança pública e qualidade de vida, com um custo de vida inferior ao de grandes capitais. "João Pessoa ainda é uma cidade pacata, com muitas áreas verdes e uma orla maravilhosa. O esporte faz parte da rotina local —natação no mar, corrida de rua, beach tênis, ciclismo— e tudo isso a um custo de vida bem inferior ao de grandes capitais, como São Paulo", afirma Bronzeado.
As regras urbanísticas também funcionam como ativo, especialmente na orla marítima. A Constituição do Estado da Paraíba e a legislação municipal determinam limites rigorosos de altura para as construções nos 500 metros da faixa de orla, proibindo a construção de espigões.
Na primeira quadra, a altura máxima é de 12,95 metros, chegando a 35 metros no final da faixa, com uma área de proteção total de 150 metros onde nada pode ser construído. No caso de João Pessoa, a lei municipal é ainda mais restritiva, limitando a altura máxima a 12,90 metros na faixa final, em vez dos 35 metros permitidos pela lei estadual.
Essa legislação garante a visão da orla, evita a modificação da paisagem costeira e assegura a ventilação e iluminação, protegendo o sombreamento da orla e os recursos naturais, de acordo com o Secovi-PB (sindicato da habitação local).
O turismo reforça a perspectiva de expansão. Dez resorts e três parques temáticos estão em construção na saída sul da cidade, próximos da praia de Tambaú. O projeto, em parceria com o governo estadual, deve dobrar a oferta hoteleira em cinco anos, adicionando 15 mil novos leitos.
Além da orla, novos bairros despontam para a expansão imobiliária:
Com o crescimento imobiliário, porém, o trânsito de João Pessoa já sente o impacto do aumento populacional. A inflação na construção civil na Paraíba é outro desafio para os incorporadores, pois tem superado a média nacional, impactando custos de terrenos, materiais e mão de obra.
"O principal ponto é a ampliação e melhoria do serviço do transporte público. Muitas pessoas deixam de comprar seus imóveis por não existir opções de transporte público que passam próximo ao seu trabalho", afirma Farias.