Lilian Sobral
O investidor apegado às letras de crédito isentas não precisa entrar em desespero. Uma ronda pelas plataformas voltadas ao varejo mostra que, apesar da menor oferta de títulos por conta da desaceleração econômica, ainda é possível encontrar papéis com prêmios atraentes, que superam os 95% do Certificado de Depósito Interfinanceiro (CDI), especialmente para prazos maiores de aplicação. As prateleiras também trazem novas opções. Voltou a crescer a oferta de títulos como Certificados de Depósito Bancário (CDB) e até as menos conhecidas Letras de Câmbio (LC), com prêmios que, após o desconto do imposto de renda, acabam se equilibrando ao das letras isentas a fim de atrair a atenção.
As Letras de Crédito Imobiliário (LCIs) e Letras de Crédito do Agronegócio (LCAs), emitidas por instituições financeiras com lastro em suas carteiras de financiamentos, fizeram a festa do investidor nos últimos dois anos, por conta especialmente da isenção de imposto de renda para a pessoa física - benefício que está sob discussão por conta da necessidade de o governo ampliar suas receitas para cobrir o déficit orçamentário. Com a menor oferta de crédito, contudo, falta lastro para que o ritmo de novas emissões seja mantido. "A economia não está ajudando quem busca crédito e isso causa uma escassez de títulos, um efeito que é possivelmente momentâneo", afirma Bruno Carvalho, gerente de renda fixa da Guide Investimentos.
Como a demanda segue firme, a rentabilidade oferecida diminuiu. Ainda assim, tudo que chega às plataformas é vendido rapidamente. Os títulos continuam bastante atraentes para quem tem um horizonte de curto prazo, pouco apetite ao risco e nenhuma disposição para pagar IR sobre os rendimentos, afirma André Moraes, analista da XP Investimentos.
"O brasileiro já entendeu que aplicar na poupança pode significar perder dinheiro, então procura produtos isentos que ofereçam a mesma facilidade e segurança da caderneta", diz. Para efeito de comparação, em 12 meses, até agosto, a caderneta rendeu 6,92%, o equivalente a 56% do CDI no período, de 12,35%.
Quem dispõe de um horizonte maior de tempo e grandes volumes de recursos para aplicação tem mais chance de conseguir retornos melhores nas letras de crédito isentas. A prateleira da Órama Investimentos, por exemplo, trazia ontem uma LCI emitida pela Brazilian Mortgages para o prazo de um ano com taxa de 96,5% do CDI. Na plataforma da Guide, o investidor encontrava ontem LCAs com retornos que variavam de 86% do CDI para seis meses, no caso do Banco ABC, a 95% para dois anos em títulos do Banco Original do Agronegócio. No caso da LCI, o retorno girava entre 92% e 93% do CDI para prazos de até um ano e meio.
Até mesmo o velho CDB, emitidos por bancos, tem surgido como opção, conforme mostrou reportagem recente do Valor. Em julho, o registro de CDBs atingiu R$ 180 bilhões, segundo dados da Cetip, revertendo uma tendência de queda nos estoques que já durava um ano. Apesar de a aplicação não ser livre de impostos como as LCIs e LCAs, as rentabilidades oferecidas para o médio e longo prazos têm compensado o pagamento de IR, cujas alíquotas vão de 22,5% para períodos de até seis meses até 15% quando o vencimento supera os dois anos.
Um título que paga 121% do CDI, como é o caso do CDB emitido pelo Banco Luso com prazo de dois anos, disponível na Órama, equivale a uma remuneração líquida de 102,85% do CDI, superando o retorno oferecido por boa parte das LCIs e LCAs.
Na Guide, os CDBs pagam taxas que variam de 93% do CDI, no caso dos papéis com liquidez diária, até 114% do CDI. Os prazos vão de dois meses a três anos. Para a maior taxa, a remuneração equivale a 96,9% do CDI líquidos de imposto.
Outro título que começa a aparecer com mais frequência nas plataformas, para quem quer diversificar as aplicações em renda fixa, é a Letra de Câmbio (LC). Emitidos por financeiras, esses papéis assemelham-se muito aos CDBs. "É uma opção importante para o investidor de perfil mais conservador que não precisa de liquidez, já que os prazos para boas rentabilidades superam um ano", afirma Sandra Blanco, consultora de investimentos da Órama. A empresa começou a oferecer LCs em sua prateleira no fim de julho. Atualmente, é possível encontrar o papel com remuneração bruta de 115% do CDI e prazo de um ano e meio. Na Guide, há letras de câmbio com retorno de 110% do CDI, para seis meses, a 114% do CDI, no caso de dois anos.
Apesar do nome, esses títulos não têm nenhuma relação com moedas estrangeiras. Nas LCs, as financeiras emitem títulos lastreados em contratos de financiamentos e, em troca do risco tomado, remuneram o investidor. O instrumento ganha bastante relevância para estas empresas, que fazem empréstimos para pessoas física, jurídica ou consignados. "Hoje a maior parte de nossa captação vem das LCs", afirma Marciano Testa, presidente da Agiplan, financeira que emite e distribui títulos tanto por meio de sua unidade de investimentos, quanto via corretoras e bancos parceiros.
Esses papéis chegaram a oferecer taxas mais atraentes no ano passado, acima dos 130% do CDI, mas também foram afetados pela queda na demanda por crédito. "Quando há menos apetite por crédito, as instituições têm menos interesse em captar e as taxas podem sofrer uma redução momentânea", afirma Luis Eduardo da Costa Carvalho, presidente e fundador da Lecca, financeira que também emite e distribui os títulos via unidade de investimentos. Assim que o mercado começar a dar sinais de melhora, os especialistas acreditam que as LCs devem voltar a oferecer retornos mais altos que os CDBs de bancos médios.
Na prática, a LC tem características muito próximas às dos CDBs. "As regras de tributação, a garantia do FGC [Fundo Garantidor de Crédito] e os prazos de aplicação e custos são muito parecidos com os títulos emitidos pelos bancos", afirma Arnaldo Curvello, diretor da Ativa Wealth Management, casa que trabalha com financeiras que emitem títulos com rentabilidades que giram em torno dos 120%.
Os títulos também podem ser pré ou pós-fixados. Isto significa que o investidor deve fazer para as LCs a mesma conta que para os CDBs ao decidir seu investimento e casar prazo para resgate com rentabilidade oferecida. Isso porque, sobre o rendimento do título, incide a tabela regressiva de imposto de renda, que vai de 22,5% a 15%. Também é importante ressaltar que aplicações resgatadas em até 29 dias são tributadas também com o IOF, que pode variar de 96% a 3% sobre o rendimento. A partir de 30 dias, o investidor está livre dessa tributação. LCIs e LCAs estão isentas de IOF. Em maio o prazo de carência para resgate dos papéis isentos foi estendido para 90 dias.
Em um título tão parecido com o CDB, pode ficar a dúvida: qual é, afinal, a vantagem das letras de câmbio? "O investimento entra como mais uma opção na busca por boas remunerações, já que há títulos que podem superar CDBs de bancos médios", afirma Mauro Calil, especialista em investimentos do banco Ourinvest, que também disponibiliza a opção no leque da renda fixa.
As casas consultadas pela reportagem tinham em suas prateleiras opções do produto com rentabilidades pós-fixadas que iam de 112% a 120% do CDI. Na maior parte delas, também era possível aplicar sem pagar taxa de custódia.
As boas taxas são possíveis porque o mercado entende que o risco de uma financeira é maior. "Na prática, porém, o risco é o mesmo, já que as operações também são garantidas pelo FGC", argumenta Curvello, da Ativa. A garantia é a mesma que de outros títulos e da poupança: até R$ 250 mil por CPF e instituição para o caso de quebra do emissor. "Apesar disso, o investidor sempre pode analisar a saúde financeira daquele emissor, olhando, por exemplo, os ratings", diz Calil, do banco Ouroinvest.
É importante lembrar que as maiores taxas são pagas por instituições de médio porte que, em teoria, têm um risco maior que o de grandes bancos do varejo.