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06/01/2017

‘Não penso em 2017. Só em 2018 e 2019’

Eduardo Fischer, copresidente da maior incorporadora do País, diz que a MRV vai manter postura de caixa conservadora este ano, mas, mesmo assim, vai anunciar um grande empreendimento imobiliário na zona norte de São Paulo.

Uma das poucas incorporadoras que não foram contaminadas pela crise do setor imobiliário nos últimos anos, a MRV, especializada em imóveis para baixa renda, vê um cenário ainda muito difícil para as construtoras em 2017.

Eduardo Fischer, copresidente da maior incorporadora do País, diz que a MRV vai manter postura de caixa conservadora este ano, mas, mesmo assim, vai anunciar um grande empreendimento imobiliário na zona norte de São Paulo. “O setor residencial é dividido em dois segmentos: média e alta renda, que passa por uma forte crise; e baixa renda, que ainda tem demanda. Estamos do lado da demanda”, diz.

Leia abaixo os principais trechos da entrevista concedida ao Estado:

A maioria das incorporadoras passa por uma crise profunda, com alto número de distratos e situação financeira delicada. Qual será o cenário para o setor neste ano?

Nosso setor está sofrendo imensamente, uma vez que é altamente dependente de condições macroeconômicas estáveis e de crédito. As incorporadoras sofreram em 2015 e tiveram um 2016 terrível. A expectativa é de melhora em 2017, mas em um cenário muito ruim ainda.

Os negócios da MRV serão afetados?

Temos de separar o setor em dois segmentos: média e alta renda de um lado, e baixa renda do outro. A nosso favor, o segmento de baixa renda tem uma diferença de oferta e demanda muito grande. Temos um déficit habitacional para essa camada da população (com até seis salários mínimos). Nesse caso, o crédito vem de bancos públicos e nosso consumidor acessa o FGTS.

Mas o desemprego também afeta o perfil de seu cliente...

O desemprego aumentou e preocupa. Mas há demanda, mesmo com a crise. Nosso cliente não quer só morar: precisa morar. É diferente do consumidor de média e alta renda – nesse caso, o setor enfrenta ainda a questão de altos distratos. Nessa categoria, há o consumidor que adquire imóvel para morar e outros que compram para investir. Com a crise, a dinâmica de mercado mudou e houve desistências, afetando fortemente as incorporadoras. É perverso. Estamos discutindo isso, via nossa entidade de classe, para mudar a regulamentação do setor.

Os distratos da MRV também aumentaram?

O nosso distrato tem caído nos últimos dois anos. Temos um saldo de distrato do passado, mas que tem recuado trimestre a trimestre e deverá cair em 2017. No caso do crédito associativo, a construtora consegue passar a dívida para os bancos (públicos). Se o banco aprova o financiamento, aprovamos a compra. A dívida fica com o banco.

E os programas do Minha Casa Minha Vida impulsionam os negócios do grupo?

Vamos voltar. Habitação de baixa renda é muito importante na economia, não é só social. O programa se mostrou resiliente. A demanda continua firme e as vendas seguem em ritmo muito bom.

Mas a demanda se concretiza em negócio? Há uma crise de confiança ainda grande.

O problema não está na confiança, mas na liberação de crédito. Trabalho basicamente com dois bancos – Caixa e Banco do Brasil. Os dois estão rígidos na concessão de crédito.

Esperava 2017 tão difícil?

Olho 2017 e, apesar de situação difícil, a perspectiva é mais positiva. Tive uma pior percepção no fim de 2014, quando não tinha ideia como o mercado iria reagir. O lado bom da crise é que, se você está em um setor que já está sofrendo muito (desde 2010), com custo de obra disparando, as perspectivas para frente são de melhora. A nossa sorte é que não podemos importar apartamento ainda.

A crise que afetou o setor vai intensificar um movimento de consolidação?

Difícil. É incerteza demais.

Mas houve interesse do fundo Jaguar em comprar fatia da Tenda, da Gafisa. Há espaço para investidor estrangeiro no setor imobiliário nacional?

Tem de olhar para o longo prazo. Os investidores apanharam muito com Brasil.

O cenário também é pessimista para os imóveis comerciais?

Hoje o segmento comercial passa por um momento diferente – esse setor já tinha puxado o freio quando a crise do setor começou. A volta à normalidade desse segmento vai ser mais rápida do que o residencial. Estão construindo menos.

O sr. acredita que o cenário de instabilidade política deve agravar mais o setor?

Essa instabilidade é ruim porque ninguém consegue olhar para 2018 e ter um cenário claro de mudanças macroeconômicas relevantes. A PEC do Teto passou, mas a reforma da Previdência é difícil e não pode demorar. Não olho mais para 2017. Penso em 2018 e 2019.

A MRV não terá novos lançamentos para este ano?

Sim. Faremos um lançamento na zona norte de São Paulo, um bairro planejado com 25 empreendimentos diferentes, em um investimento de quase R$ 1 bilhão e VGB de R$ 1,6 bilhão, para entrega nos próximos cinco anos. Nos últimos 30 meses, entregamos 100 mil chaves (o que equivale a uma cidade de 350 mil a 400 mil habitantes). A projeção é fazer a mesma entrega nos próximos 30 meses. Nos últimos dois anos, investimos cerca R$ 600 milhões em terrenos novos.

Pensam em mudar de estratégia e se diversificar?

Não. Fazemos a mesma coisa há 37 anos e vamos continuar assim. 

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO