ABECIP na mídia

21/11/2016

Construtora ainda resiste em proteger seus imóveis

Esse número, apesar de não representar o universo total, reúne a maioria dos contratos, segundo a Abecip, por agregar financiamentos liberados pelos oito principais bancos neste setor no país.

Criada há 15 anos com o objetivo de evitar que o episódio da incorporadora Encol se repetisse, o instrumento de proteção para compradores de imóveis - chamado de patrimônio de afetação - ainda não é usado em larga escala. Levantamento feito pela Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança (Abecip) em 5.229 contratos de financiamento imobiliário mostra que em 54% dos empreendimentos tocados por empresas de capital aberto e fechado em todo o Brasil essa ferramenta não é usada.

Esse número, apesar de não representar o universo total, reúne a maioria dos contratos, segundo a Abecip, por agregar financiamentos liberados pelos oito principais bancos neste setor no país.

Dados isolados de algumas incorporadoras mostram uso ainda menos intensivo dessa proteção. Isso acontece principalmente em empresas que enfrentam dificuldades financeiras. Na Viver, que pediu recuperação judicial em setembro, das 64 sociedades de propósito específico (prontas e em obras), só 16 têm patrimônio de afetação. E na maioria desses 16, o instrumento passou a ser utilizado quando 85% da obra já havia sido erguida. Em alguns casos, a construção chegava à 99%.

Na PDG, que tem o passivo a descoberto e também pode ter de recorrer à recuperação judicial, o uso do patrimônio de afetação fica abaixo de 15%, segundo o Valor apurou com duas fontes próximas à companhia.

Procuradas, algumas incorporadoras de capital aberto dizem ter ampliado o uso do patrimônio de afetação. (leia Bancos tendem a exigir mais o instrumento)

Quando foi criado, por meio de medida provisória, a expectativa era que essa proteção do empreendimento fosse amplamente usada até por uma demanda dos consumidores e credores. O uso do instrumento, porém, foi deixado como opcional para os incorporadores, que à época reclamaram da medida. O que se vê hoje é que o instrumento ainda é desconhecido pelo lado dos compradores. "Comercialmente, não é um argumento de venda, pois ainda há um desconhecimento grande por parte dos clientes", diz o diretor financeiro de uma incorporadora com ações em bolsa.

Em muitos casos, os bancos aceitaram outros tipos de proteção aos empréstimos dados, como ações do empreendimento, terrenos ou até outros projetos, apesar de o patrimônio de afetação às vezes baratear o financiamento. "O patrimônio de afetação possibilitou melhora da percepção de risco por parte dos bancos, resultando em menor custo do crédito", afirma o diretor de finanças da MRV Engenharia, Leonardo Corrêa.

O principal estímulo para o uso do patrimônio de afetação veio em 2009, quando o governo criou incentivos fiscais para empreendimentos que usassem esse instrumento. Por meio de um regime tributário especial, as empresas passaram a pagar uma alíquota de 6% sobre as vendas. Em 2013, houve nova redução, para 4%, o que deu um impulso maior ao uso do patrimônio de afetação.

É a partir disso que as incorporadoras fazem as contas para saber se compensa usar a blindagem. "Tudo depende da estrutura de financiamento do projeto. É uma questão do custo do dinheiro", diz Rossana Fernandes Duarte, sócia para a área de negócios imobiliários do escritório Mattos Filho. Em alguns casos, pode ser mais vantajoso pagar imposto pelo lucro presumido ou real, ou aderir ao benefício fiscal mais para o fim do projeto, quando mais unidades são vendidas.

Outros pontos também entram na equação das incorporadoras. O uso de patrimônio de afetação demanda que as incorporadoras tenham recursos disponíveis em caixa para as necessidades da holding, pois o dinheiro dos projetos só fica liberado depois que todas as contas do empreendimento são quitadas, incluindo financiamento bancário. Na MRV, R$ 300 milhões não podem ser acessados devido ao patrimônio de afetação.

"Só terei acesso, em 2020, ao caixa de um empreendimento lançado hoje", diz o diretor financeiro da EZTec, Emilio Fugazza.

Para incorporadoras mais endividadas, a modalidade restringe a liquidez das empresas, já que os recursos não podem transitar dos projetos para a holding.

A gestão das finanças dos projetos blindados também é mais trabalhosa. "A afetação também traz ônus ao incorporador. Ele precisa estar com as contas bem separadas e estar aberto a prestar esclarecimento aos compradores dos imóveis", diz Gilberto Duarte de Abreu Filho, presidente da Abecip. Imóveis com patrimônio de afetação são obrigados a ter uma comissão de representantes, formada por pelo menos três compradores de unidades do empreendimentos. 

FONTE: VALOR ECONôMICO